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| O inibidor de PRC2 remove os "freios" que impedem os linfócitos T de atacar o câncer (imagem: Blausen Medical 2014/WikiJournal of Medicine) |
Atualmente, metade dos pacientes com linfoma não
Hodgkin e com leucemia linfoblástica aguda – dois tipos de câncer que afetam células
do sangue – não responde adequadamente ao tratamento com células CAR-T. Essa
terapia consiste em coletar células de defesa da própria pessoa a ser tratada
(linfócitos T), modificá-las em laboratório para que se tornem capazes de
destruir as células tumorais e reinjetá-las no organismo. Esses casos
refratários normalmente recidivam após a imunoterapia convencional (leia
mais em: agencia.fapesp.br/31656 e agencia.fapesp.br/41521).
Para contornar o problema, pesquisadores
brasileiros desenvolveram uma versão mais potente das células CAR-T. Os
detalhes da pesquisa foram divulgados na revista Cancer
Research.
“A imunoterapia com células CAR-T é revolucionária
e tem salvado a vida de muitas pessoas nos últimos anos. No entanto, ainda há
uma parcela significativa de pacientes que não responde a esse tratamento.
Testamos uma série de drogas nas células CAR-T e uma delas revelou-se
promissora ao inibir alterações epigenéticas [relacionadas com o padrão de
expressão dos genes] que tornavam as células pouco eficientes contra esses dois
tipos de tumor hematológico”, conta Maria Letícia Rodrigues Carvalho, primeira autora
do estudo realizado no A.C. Camargo Cancer Center com apoio de Bolsa de Mestrado da FAPESP, hoje no doutorado.
Como explicam os autores, o linfoma não Hodgkin
acomete majoritariamente adultos de meia-idade, enquanto os pacientes de
leucemia linfoblástica são, em sua maioria, crianças.
Os estudos foram realizados em células tumorais (in
vitro) e em camundongos (in vivo) e representam o primeiro passo
para que, no futuro, possa haver ensaios em humanos.
Entre as drogas testadas nas células CAR-T, a que
mostrou maior potencial foi um inibidor do complexo de proteínas conhecido pela
sigla PRC2. No organismo saudável, essas proteínas são necessárias para induzir
a expressão dos genes que freiam a ação das células de defesa, para que estas
não ataquem as células saudáveis.
“No entanto, no contexto do câncer, é importante
que não haja freios como estes, a fim de que ocorra a eliminação completa do
tumor. Embora a base da imunoterapia com células CAR-T seja justamente retirar
esses freios, alguns ainda permanecem. O que fizemos foi remover aqueles que
impedem uma melhor resposta contra o linfoma não Hodgkin e contra a leucemia
linfoblástica aguda”, explica Tiago da Silva Medina, pesquisador do A.C. Camargo Cancer
Center apoiado pela FAPESP e
coordenador do estudo.
Fabricação
Primeiramente, os pesquisadores produziram células
CAR-T a partir de células mononucleares de sangue periférico de pessoas
saudáveis, obtidas nos bancos de sangue do A.C. Camargo Cancer Center, em São
Paulo, e do Instituto Nacional de Câncer (Inca), no Rio de Janeiro.
Além disso, coletaram células CAR-T produzidas a
partir do sangue de pacientes com os dois tipos de tumor e usadas em seu
próprio tratamento no A.C. Camargo Cancer Center.
As células CAR-T foram modificadas com o inibidor
do complexo PRC2 e usadas para tratar (in vitro) os dois tipos de
células tumorais refratários à imunoterapia. Como resultado, os tumores foram
eliminados mais rápida e eficientemente do que as amostras tratadas com as
CAR-T convencionais (sem a inibição do PRC2).
Os pesquisadores partiram então para testes em
camundongos que desenvolveram os dois tipos de tumor. Após o tratamento com o
inibidor de PRC2, as células CAR-T foram lavadas antes de serem injetadas nos
animais, a fim de garantir que não haveria resquícios do inibidor e, portanto,
evitar a ação do composto em células não desejadas e mitigar o risco de
eventual toxicidade sistêmica. Depois de 39 dias, os animais que receberam as
células CAR-T modificadas tiveram uma melhora superior aos tratados com as
convencionais.
“A modificação feita nas células CAR-T induziu uma
resposta mais persistente no organismo e resultou em maior eliminação do tumor,
tanto in vitro quanto in vivo. A abordagem
epigenética melhora a qualidade dessa imunoterapia e abre uma perspectiva
bastante promissora”, afirma Medina.
Os pesquisadores planejam agora testar os possíveis
efeitos colaterais da terapia em camundongos. Isso porque os tratamentos
aprovados são conhecidos por causar um aumento exacerbado da inflamação nos
pacientes. O problema é amenizado com medicamentos aprovados para esse fim, que
são parte do protocolo da imunoterapia.
“Se os novos estudos apontarem que o tratamento é
seguro, a inibição de PRC2 poderia futuramente ser incorporada à fabricação das
células CAR-T, aumentando a eficácia da imunoterapia sem aumentar os riscos
sistêmicos”, conclui Carvalho.
O trabalho contou com apoio da FAPESP também por
meio de bolsas de doutorado e pós-doutorado concedidas a alguns dos coautores (22/00747-8, 20/10299-7 e 19/25129-2).
O artigo Targeting PRC2 Enhances the Cytotoxic Capacity of Anti-CD19 CAR-T Cells Against Hematological Malignancies pode ser lido em: https://aacrjournals.org/cancerres/article-abstract/doi/10.1158/0008-5472.CAN-24-1643/751986/Targeting-PRC2-Enhances-the-Cytotoxic-Capacity-of.
André Julião
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/modificacao-torna-ainda-mais-potente-imunoterapia-usada-contra-cancer-no-sangue/54397

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