Milhões sofrem em
silêncio enquanto o sistema de saúde ignora a condição como um problema real
Mais de 30 milhões de mulheres estão na menopausa
no Brasil. No entanto, apenas 238 mil foram diagnosticadas no Sistema Único de
Saúde (SUS). Enquanto isso, o país conta com 40 mil ginecologistas, mas somente
18% sabem prescrever terapia hormonal. Os números são alarmantes e revelam um
cenário de negligência institucional.
“O Brasil abandonou suas mulheres na menopausa. As
que podem pagar por um tratamento seguem em frente. As que não podem, padecem
em silêncio. Isso é justo? Isso é aceitável? O que estamos esperando para
agir?”, questiona Fabiane Berta, ginecologista, pesquisadora e fundadora do
MyPausa, um movimento que busca transformar a forma como o país enxerga e trata
a menopausa.
Por décadas, a menopausa foi reduzida a ondas de
calor e sudorese noturna, mas a verdade é que mais de 100 sintomas estão
associados a essa fase, afetando física, emocional e cognitivamente as
mulheres. Ansiedade, depressão, insônia, palpitações, boca e olhos secos, dores
articulares, perda de memória, crises de pânico, enxaquecas e até formigamento
são apenas alguns dos sintomas que milhões de brasileiras enfrentam diariamente
sem sequer saber que estão relacionados à menopausa.
"A menopausa não é apenas sobre calorões. Existem
centenas de sintomas associados a essa fase, e muitas mulheres não os
reconhecem. Elas sofrem em silêncio, sem saber que estão relacionados à
menopausa", alerta a pesquisadora.
A falta de diagnóstico e tratamento adequado leva
muitas mulheres a questionarem sua sanidade mental. Sem respostas, muitas
acabam sendo medicadas com antidepressivos quando, na verdade, precisavam de um
acompanhamento adequado para o climatério.
De acordo com a ginecologista, a menopausa não
afeta apenas a saúde das mulheres, mas também suas carreiras, sua autoestima e
sua autonomia financeira. Pesquisas indicam que milhares de mulheres pedem
demissão durante essa fase porque se sentem incapazes de manter a
produtividade. Dificuldade de concentração, crises de ansiedade e falta de
suporte adequado dentro do ambiente corporativo fazem com que muitas sejam
levadas ao limite.
"A menopausa não é apenas uma questão de
saúde, mas também é uma questão econômica. Mulheres no auge de suas carreiras
estão deixando o mercado de trabalho devido à falta de suporte adequado durante
essa fase", lamenta Berta.
Além disso, um dado ainda mais preocupante precisa
ser trazido à tona: o suicídio entre mulheres na pré-menopausa e menopausa está
crescendo em todo o mundo. A ausência de acolhimento, o impacto hormonal e a
sensação de invisibilidade geram desespero e isolamento, levando muitas a
tomarem medidas extremas.
"A falta de compreensão e apoio durante a
menopausa está levando mulheres ao desespero, afetando sua saúde mental e, em
casos extremos, resultando em suicídio. O Brasil precisa parar de fingir que
esse problema não existe", alerta Fabiane Berta.
Diante desse cenário caótico, a pesquisadora lidera
o MyPausa, um movimento que não aceita mais o silêncio e a negligência. A
iniciativa luta para incluir a terapia hormonal no SUS em todo território
nacional, garantindo que todas as mulheres, independentemente de sua condição
financeira, tenham acesso a um tratamento digno.
Para isso, o MyPausa está criando o primeiro
registro nacional da menopausa, mapeando os 27 estados brasileiros para
entender de fato a realidade das mulheres nesta fase da vida. Essa pesquisa
pretende influenciar políticas públicas e reformular a forma como a menopausa é
tratada no Brasil.
"A inclusão da terapia hormonal no SUS não é
luxo, não é capricho, é uma questão de justiça social e saúde pública, mesmo
porque a terapia já é oferecida em pouquíssimos municípios. A menopausa não
pode continuar sendo tratada como um problema individual que cada uma resolve
como pode", enfatiza Fabiane Berta.
De acordo com a ginecologista, um dos maiores
retrocessos na área foi a descontinuação do implante de estradiol, um
tratamento amplamente conhecido há mais de 20 anos e retirado não por
ineficiência do produto, mas por questões políticas. “O estrogênio em pellet
hormonal precisa ser retomado em todo o país urgente. Não há justificativa para
a ausência de um tratamento seguro, eficaz e acessível para mulheres",
destaca Fabiane Berta.
Segundo a pesquisadora, a menopausa não é uma
experiência única e padronizada. Cada mulher tem suas singularidades, e o
acesso à terapia hormonal deve ser ampliado para contemplar essa diversidade.
"A menopausa precisa ser tratada de forma individualizada. Somos únicas e
plurais, e nossos tratamentos precisam refletir essa singularidade. A ampliação
da terapia hormonal no SUS precisa considerar as diferentes realidades das
mulheres brasileiras", reforça.
O objetivo do movimento é mais do que garantir
acesso à terapia hormonal para todas as mulheres. É educar, transformar e
romper o ciclo de silêncio que há décadas invisibiliza essa fase da vida
feminina. "É inaceitável que, em pleno século XXI, milhões de brasileiras
enfrentem a menopausa sem informação, sem apoio e sem tratamento adequado.
Precisamos educar nossas meninas desde cedo sobre todas as fases da vida
feminina, para que estejam preparadas e empoderadas para lidar com cada uma
delas", reforça a pesquisadora.
De acordo com Berta, o Brasil precisa acordar para
a menopausa. “O que estamos esperando? Que mais mulheres adoeçam? Que mais
mulheres abandonem seus empregos? Que mais mulheres percam sua qualidade de
vida? Que mais mulheres desistam? Se hoje o Brasil não sabe lidar com a
menopausa, imagine o que vai acontecer quando as próximas gerações chegarem a
essa fase? Vamos seguir fingindo que o problema não existe? Vamos deixar nossas
mães, nossas irmãs, nossas filhas e netas sem assistência? Eu me recuso. Essa
luta é agora”, finaliza.
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