A gestação gemelar é um fenômeno fascinante e desafiador dentro da obstetrícia e reprodução humana. Caracteriza-se pelo desenvolvimento simultâneo de dois ou mais fetos no útero materno e pode ocorrer tanto de forma natural quanto por meio de técnicas de reprodução assistida. Com o aumento da idade materna e o avanço das tecnologias de fertilização, a incidência de gestações gemelares tem crescido nos últimos anos.
Embora seja um evento desejado por muitas famílias, a gestação
gemelar apresenta particularidades que demandam um acompanhamento médico
diferenciado. O risco materno-fetal é superior ao de gestações únicas, exigindo
monitoramento rigoroso para garantir um desfecho seguro para a mãe e os bebês.
Este artigo aborda os tipos de gestações gemelares, seus fatores determinantes,
riscos e os principais cuidados pré-natais necessários para um bom prognóstico.
As gestações gemelares podem ser classificadas em dois grandes
grupos:
1) Dizigótica (fraterna): resulta da fecundação de dois óvulos
diferentes por dois espermatozoides distintos, gerando gêmeos geneticamente
únicos, como irmãos comuns. Esses gêmeos podem ser do mesmo sexo ou de sexos
diferentes e possuem placentas e sacos amnióticos independentes (dicoriônicos e
diamnióticos).
2) Monozigótica (idêntica): ocorre quando um único óvulo é
fertilizado e, posteriormente, sofre divisão em dois embriões geneticamente
idênticos. Dependendo do momento da divisão, os gêmeos podem compartilhar
placenta (monocoriônicos) e/ou bolsa amniótica (monoamnióticos). Esse tipo de
gestação têm um risco maior de complicações, como a síndrome da transfusão
feto-fetal.
A distinção entre gestação dicoriônica e monocoriônica é
essencial, pois influencia diretamente o manejo obstétrico e o prognóstico
fetal.
Diversos fatores aumentam a probabilidade de uma gestação gemelar,
incluindo:
1) Idade materna avançada: mulheres acima de 35 anos apresentam
maior liberação de FSH, o que pode levar à ovulação de múltiplos óvulos.
2) Histórico familiar: a herança genética tem um papel
importante, especialmente nas gestações dizigóticas, sendo mais comum em
algumas famílias.
3) Etnia: estudos indicam que mulheres de ascendência africana têm maior
probabilidade de gestações gemelares, enquanto as asiáticas apresentam menor
incidência.
4) Técnicas de reprodução assistida: a indução da ovulação e a fertilização
in vitro (FIV) aumentam significativamente a taxa de gêmeos, principalmente com
a transferência de múltiplos embriões.
A gestação gemelar está associada a complicações maternas e fetais
mais frequentes do que a gestação única. Entre os principais riscos,
destacam-se:
• Riscos Maternos:
Hipertensão gestacional e pré-eclâmpsia: o risco é duas a três
vezes maior em gestações gemelares.
Diabetes gestacional: o aumento da resistência à insulina pode
predispor à diabetes durante a gestação.
Parto prematuro: cerca de 50% das gestações gemelares resultam em
nascimento antes das 37 semanas.
Hemorragia pós-parto: o útero mais distendido está mais propenso à
atonia uterina, aumentando o risco de sangramentos.
• Riscos Fetais:
Síndrome da transfusão feto-fetal (STFF): ocorre em gêmeos
monocoriônicos quando há desequilíbrio na troca sanguínea entre os fetos,
podendo comprometer o desenvolvimento de um ou ambos.
Restrição do crescimento intrauterino (RCIU): a nutrição intra
uterina pode ser comprometida, levando a diferenças significativas no peso dos
bebês.
Anomalias congênitas: o risco de malformações é ligeiramente maior
em gestações gemelares do que nas únicas.
Óbito fetal intra útero: em casos de complicações graves, um
dos fetos pode não sobreviver, aumentando o risco para o gêmeo sobrevivente.
Diante dos riscos aumentados, o acompanhamento pré-natal deve ser
rigoroso e individualizado. As principais recomendações incluem:
Consultas mais frequentes: enquanto em gestações únicas o pré-natal
ocorre mensalmente no início, em gestações gemelares é recomendado um
seguimento mais intensivo, com consultas quinzenais ou semanais no terceiro
trimestre.
Ultrassonografia seriada: essencial para monitoramento do
crescimento fetal e diagnóstico precoce de complicações, como a STFF.
Na gestação gemelar, as necessidades nutricionais e de
suplementação são mais elevadas em comparação com a gestação única, devido ao
maior gasto energético e à demanda aumentada por nutrientes essenciais para o
crescimento de dois fetos. As principais diferenças incluem:
1. Aumento das Necessidades Energéticas
O consumo calórico deve ser maior, com um acréscimo médio de 300 a
450 kcal/dia a mais do que o recomendado para uma gestação única. Isso ajuda a
suprir as demandas fetais e reduzir o risco de restrição de crescimento
intrauterino (RCIU).
2. Maior Ganho de Peso Recomendado.
Em gestações únicas, o ganho de peso recomendado varia conforme o
IMC materno, mas em gestações gemelares, os valores são mais altos:
IMC normal (18,5–24,9): 16 a 24 kg
Sobrepeso (25–29,9): 14 a 22 kg
Obesidade (≥30): 11 a 19 kg
A distribuição do ganho de peso ideal é cerca de 5 a 7 kg no
primeiro trimestre e 0,7 kg por semana no segundo e terceiro trimestres.
3. Suplementação Nutricional Específica
As necessidades de vitaminas e minerais são ampliadas para
prevenir complicações materno-fetais:
Ácido fólico: a dose recomendada em gestação única é de 400 mcg/dia, mas em
gestação gemelar recomenda-se 800 mcg a 1 mg/dia, devido ao maior risco de
defeitos do tubo neural.
Ferro: a demanda é significativamente maior, pois há um risco aumentado
de anemia. A recomendação é 60 a 100 mg de ferro elementar/dia, em comparação
com 30–60 mg na gestação única.
Cálcio: fundamental para o desenvolvimento ósseo fetal e prevenção
de pré-eclâmpsia. A dose recomendada é de 1000–1500 mg/dia.
Ômega-3 (DHA): auxilia no desenvolvimento neurológico e reduz o risco de parto
prematuro. A suplementação recomendada é de 200–300 mg/dia.
Proteína: o aumento da ingestão proteica é essencial para a
formação de tecidos fetais e placenta. O recomendado é cerca de 1,5 g/kg/dia,
superior ao da gestação única.
4. Maior Risco de Deficiências Nutricionais
Gestantes de gêmeos estão mais propensas a desenvolver
deficiências de ferro, cálcio, vitamina D e proteínas, o que pode levar a
complicações como anemia, osteopenia materna e atraso no crescimento fetal.
O acompanhamento nutricional frequente é fundamental para ajustar
a dieta e a suplementação conforme a evolução da gestação.
O acompanhamento nutricional individualizado é essencial para
garantir um adequado crescimento fetal e reduzir complicações maternas, como
pré-eclâmpsia, parto prematuro e baixo peso ao nascer. Se precisar de mais
detalhes, posso aprofundar algum ponto específico!
As gestantes de gêmeos geralmente precisam de mais repouso e
cuidados especiais em comparação com gestantes de feto único, devido ao maior
risco de complicações como parto prematuro, insuficiência cervical e síndrome
da transfusão feto-fetal (STFF). No entanto, a necessidade de repouso absoluto
deve ser avaliada caso a caso.
1. Repouso Relativo x Absoluto
Repouso relativo: recomendado para a maioria das gestantes
gemelares, especialmente a partir do terceiro trimestre. Inclui redução de
atividades extenuantes, evitar longos períodos em pé e manter intervalos de
descanso ao longo do dia.
Exercícios Físicos São Permitidos
E sobre a prática de exercícios físico, em gestações gemelares sem
complicações, atividades físicas de baixa intensidade (como caminhadas leves e
alongamentos) podem ser mantidas até o final do segundo trimestre, com
supervisão médica.
Exercícios de alto impacto, musculação intensa e atividades que
aumentem a pressão intra-abdominal devem ser evitados.
A gestação gemelar é um evento único, que exige um acompanhamento
diferenciado para garantir a saúde materna e fetal. Com os avanços na medicina
materno-fetal e no manejo obstétrico, é possível reduzir riscos e melhorar os
desfechos perinatais. O papel do especialista em reprodução humana é
fundamental na orientação dos casais que desejam engravidar e na condução
adequada dessas gestações.
Com um pré-natal bem conduzido e um acompanhamento criterioso, os desafios da gestação gemelar podem ser minimizados, proporcionando uma experiência mais segura para a mãe e os bebês.
Dra. Daianni da Cunha Barboza - graduada em Medicina pela Universidade de Cuiabá – UNIC. Pós-graduada em Reprodução Humana pelo Instituto de Ensino e Pesquisa em Medicina Reprodutiva de São Paulo e título de especialista em Ginecologia e Reprodução Humana pela Febrasgo. Médica da Associação Mulher Ciência e Reprodução Humana do Brasil (AMCR). CRM 7541 – MT | RQE 5300
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