Brasil ocupa a 109ª posição entre 146 países no ranking de igualdade de gênero, segundo o Fórum Econômico Mundial
De acordo com o Dossiê Mulheres e Violência, da
Agência Patrícia Galvão, 62% das brasileiras consideram o Brasil um país muito
machista, revelando uma visão consolidada sobre a desigualdade de
gênero. Esse dado ressalta a percepção do machismo como um fenômeno enraizado
nas estruturas sociais e econômicas do país, impactando especialmente as
mulheres.
Essa realidade é endossada pelo Fórum Econômico Mundial que coloca o
Brasil em 109ª posição entre 146 países no ranking de igualdade de gênero
(Relatório Global de Desigualdade de Gênero de 2023), evidenciando os desafios
nas oportunidades e no desenvolvimento das mulheres.
"Desde a infância, as pessoas são expostas a
ideias e valores, culturalmente com bases religiosas diretas e indiretas, que
perpetuam essa estrutura. Frases como 'homem não chora' e 'mulher não sabe
dirigir', que vão materializar arquétipos de masculinidade e feminilidade
relacionados à virilidade e à inteligência apenas doméstica, reforçam
estereótipos de gênero, limitando tanto homens quanto mulheres em sua liberdade
e expressão. Esses comportamentos se estendem para o ambiente profissional,
acadêmico e até mesmo familiar, afetando diretamente a autoestima, o desempenho
e as oportunidades de crescimento das mulheres", afirma a cientista da
religião e Presidente do Ipefem (Instituto de Pesquisa de Estudos do Feminino),
Ana Tomazelli.
Impacto da assimetria de
gênero no ambiente de trabalho
Dados da McKinsey mostram que apenas 39% das mulheres se
sentem valorizadas no trabalho, em comparação a 52% dos homens. Atitudes
machistas minam a autoconfiança feminina e perpetuam a desigualdade nas
empresas.
Além disso, as mulheres enfrentam desafios para
equilibrar a vida pessoal e a carreira. A ausência de políticas de
flexibilidade e apoio à parentalidade prejudica especialmente aquelas que são
mães, contribuindo para a evasão de talentos femininos e reduzindo a
diversidade e inovação nas organizações.
"Avanços têm ocorrido, mas ainda há um longo
caminho pela frente. Empresas que investem em treinamentos para educar homens e
que oferecem mentorias para mulheres, além de implementar políticas de
tolerância zero para discriminação, observam ganhos em produtividade e
satisfação no ambiente de trabalho, diminuindo turnover e economizando em
gastos médicos com saúde de uma maneira geral. Assim, superar os comportamentos
machistas no ambiente corporativo é tanto uma questão ética quanto estratégica
– um passo necessário para um futuro mais igualitário e próspero para todos",
destaca Tomazelli.
Machismo estrutural: impacto
nas relações cotidianas
Estudos indicam que o machismo não apenas impede o
desenvolvimento das mulheres, mas também gera ambientes tóxicos e menos
colaborativos. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) aponta que
atitudes como "mansplaining" e "manterrupting", comuns em
diversos contextos, criam um clima de exclusão e isolamento.
"Esses comportamentos marginalizam as vozes
femininas e desvalorizam suas contribuições, o que afeta não só a autoestima
das mulheres, mas também a dinâmica das equipes e o desenvolvimento
organizacional. Quando uma ideia é subestimada por vir de uma mulher, a
inovação e a diversidade de pensamento são prejudicadas, limitando o potencial
de soluções criativas e inclusivas", observa Ana.
A psicanalista acrescenta que romper esse ciclo é
fundamental para promover mudanças culturais e educacionais. "Programas
educacionais voltados para a equidade de gênero desde a infância e a
sensibilização sobre os impactos das assimetrias de gênero são passos
essenciais para construir uma sociedade mais justa. Políticas públicas que
incentivem a igualdade de responsabilidades domésticas, como licenças parentais
compartilhadas, também são vitais para estabelecer uma nova base de relações mais
equitativas", afirma.
Para identificar como o machismo se manifesta em
ações cotidianas, a seguir estão 10 atitudes violentas que são frequentemente
ignoradas. Conhecer essas práticas é o primeiro passo para combatê-las e
promover um ambiente mais inclusivo e respeitoso para todos.
Algumas ações machistas e
tóxicas
1) Manterrupting: Interrupções frequentes e sem função prática, que impedem que uma
mulher conclua sua fala ou raciocínio. Cerca de 20% das mulheres relatam
sentir-se ignoradas ou negligenciadas por colegas durante reuniões virtuais;
2) Mansplaining: Um homem explica algo óbvio a uma mulher de forma didática, sugerindo
que ela não seria capaz de compreender - algumas vezes, inclusive, ele está
explicando algo que a mulher domina, ou que, até mesmo, foi criado por ela;
3) TPM Mania: Insinuações de que uma reação ou atitude é influenciada pelo ciclo
menstrual, de forma pejorativa, como se faltasse controle emocional por parte
da mulher;
4) Bropriating: Apropriação de uma ideia previamente expressa por uma mulher, com o
homem levando os créditos pela ideia original, dentro ou fora da empresa.
Equivalente ao roubo de propriedade intelectual;
5) Gaslighting: Manipulação psicológica para fazer uma mulher duvidar de sua sanidade
mental ou percepção, ainda que ela tenha motivos e razões pragmáticas para agir
ou reagir de determinada maneira;
6) Meritocracia masculina: Quando a mulher perde uma oportunidade de promoção ou crescimento para
um homem menos qualificado;
7) Filho é coisa de mulher: Desconsideração da mulher em atividades ou oportunidades devido à sua
condição de mãe ou intenção de ter filhos, além de não considerar os
compromissos parentais na organização de eventos;
8) Lookism: Valor atribuído a uma mulher exclusivamente com base em sua aparência
física, com julgamentos sobre roupas, peso e maquiagem que diminuem sua
competência profissional. Para 56% das mulheres, o julgamento pela aparência
afeta suas oportunidades profissionais (IBGE).
9) Desqualificação emocional: Opiniões ou sentimentos de uma mulher são desvalorizados como
"emoções exageradas", reforçando estereótipos de instabilidade
emocional. Segundo o Centro de Liderança Feminina (CLF), 47% das mulheres
relatam sentir que suas opiniões são frequentemente desconsideradas no trabalho,
quando não se avalia o que causou a reação, mas, apenas, as reações em si;
10) Responsabilidade doméstica
exclusiva: Expectativa de que as mulheres assumam todas as
responsabilidades domésticas, mesmo trabalhando fora. Segundo a PNAD de 2023,
as mulheres brancas dedicam, em média, 20,9 horas semanais às atividades
domésticas e as mulheres negras chegam a 26 horas,, enquanto os homens (em
geral) dedicam, em média, 11,1 horas, reforçando uma desigualdade nas
obrigações de cuidado.
São, principalmente, os comportamentos 07 e 10 que,
segundo a professora Claudia Costin, ganhadora do Prêmio Nobel de Economia em
2023, os grandes ofensores da paridade de gênero em casa e que resultam na
dificuldade de alcançar a equidade de gênero no mercado de trabalho.
“A garantia de direitos para as mulheres passa, invariavelmente, pelo reconhecimento de deveres dos homens e é isso o que fazemos no Ipefem: falamos com os homens.", finaliza Ana Tomazelli.
Ana Tomazelli - psicanalista e Presidente do Ipefem (Instituto de Pesquisas & Estudos do Feminino e das Existências Múltiplas), uma ONG de educação em saúde mental para mulheres no mercado de trabalho. Mentora de Carreiras, Executiva em Recursos Humanos, por mais de 20 anos, liderou reestruturações de RH dentro e fora do país. Com passagens pelas startups Scooto e B2Mamy, além de empresas tradicionais e consolidadas como UHG-Amil, Solera Holdings, KPMG e DASA (Diagnósticos da América S/A). Mestranda em Ciências da Religião pela PUC-SP e membro do grupo de pesquisa RELAPSO (Religião, Laço Social e Psicanálise) da Universidade de São Paulo, também é pós-graduada em Recursos Humanos pela FIA-USP e em Negócios pelo IBMEC-RJ. Formada em Jornalismo pela Laureate - Anhembi Morumbi.Linkedin/anatomazellibr
Instagram @ipefem
Instituto de Pesquisa de Estudos do Feminino e das Existências Múltiplas - Ipefem https://ipefem.org.br/
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