segunda-feira, 1 de julho de 2024

Endometriose pode ser a causa de 40% dos casos de infertilidade

Sintomas semelhantes a outras doenças mascaram este sofrimento às pacientes

 

Segundo o Ministério da Saúde, no grupo de mulheres com infertilidade, estima-se que a prevalência de endometriose pode chegar a 40%, sendo esta patologia a principal causa feminina da dificuldade para engravidar. Além da infertilidade, a endometriose pode trazer sintomas em outros sistemas como urinários, gastrointestinais e ortopédicos, como dores lombares ou que irradiam às pernas, o que faz com que a paciente busque ajuda com outras especialidades médicas – e não com ginecologista.  

A avaliação clínica, associada ao exame de toque vaginal, detecta até 80% dos casos. A maior dificuldade, segundo Ana Luisa Alencar De Nicola, médica consultora da Fundação Instituto de Pesquisa e Estudo de Diagnóstico por Imagem (FIDI), ainda é a relação que a paciente deve fazer entre os sintomas para endometriose. 

“É possível que metade das adolescentes com dismenorreia intensa possa ter endometriose, ou seja, a cólica menstrual que impede atividades cotidianas ou aquele grupo onde a escala visual analógica de dor (EVA) é maior que sete, numa escala de zero a dez, deve suscitar o diagnóstico. Entretanto, uma grande parte destas meninas nem reconhecem esta dor como algo anormal, pois existe uma banalização da cólica menstrual, mundialmente. Este talvez seja o principal fator que colabore para o atraso no diagnóstico da doença. Além disso, estima-se que até 10% das portadoras possam ser assintomáticas e nem buscarão o diagnóstico”, explica a médica. 

Uma informação importante sobre a paciente para ser levada ao profissional ginecologista é o histórico familiar. De acordo com a Sociedade Brasileira de Endometriose (SBE), mulheres que tenham parentes em primeiro grau diagnosticadas com a doença tem um risco sete vezes maior de desenvolver endometriose. 

Ana Luisa acrescenta que, após a avaliação clínica e o exame físico, são solicitados exames de imagem complementares, como ultrassonografia transvaginal, que são capazes de diagnosticar a endometriose ovariana e a adenomiose (endometriose do útero) ou ainda mostrar suspeita da endometriose profunda; a ultrassonografia transvaginal com preparo intestinal ou a ressonância magnética da pelve, ambas com altíssima acurácia para diagnóstico de todas as formas da endometriose, inclusive o chamado mapeamento pélvico da doença. A ressonância magnética pélvica com preparo intestinal é também indicada para mulheres que ainda não tiveram relações sexuais com penetração e não podem realizar a ultrassonografia transvaginal. 

“Os exames estão disponíveis nos grandes centros, inclusive em alguns serviços públicos. Mas, com certeza, precisamos manter treinamentos contínuos de médicos radiologistas e ultrassonografistas para atendermos esta demanda. Também precisamos superar as dificuldades de diagnóstico, trabalhando com campanhas de conscientização, pois o mais comum é que as pacientes sejam orientadas a usar pílula anticoncepcional para amenizar sua cólica, como as adolescentes, e assim sigam por muitos anos convivendo com a doença sem saber do seu diagnóstico e sem tratamento para efetivo bloqueio do seu crescimento”, observa Ana Luisa.  

Na FIDI, por exemplo, nos últimos cinco anos, foram realizados cerca de 14,7 mil procedimentos de mais de 40 tipos, que ajudam na detectação da endometriose. A instituição é a maior prestadora de serviços de diagnóstico por imagem do SUS. Apenas de janeiro a maio deste ano, já foram feitos mais de 1.200 exames de imagem somente para apoiar a avaliação dos médicos sobre a ocorrência de endometriose. A faixa etária principal é de pessoas adultas – 12.790 procedimentos -, seguida de idosas, adolescentes e crianças. Segundo Ana Luisa, tem-se reduzido o tabu em relação aos exames ginecológicos, que apoiam a conclusão de um diagnóstico, mas ele ainda existe. Ela orienta como rotina para qualquer mulher a ida ao ginecologista, todos os anos, e que, na ocasião da consulta, relate todos os seus sintomas e não banalizem a cólica menstrual.  

“Toda dor associada ao período menstrual deve ser contada ao médico, por mais estranha que pareça. Outro exemplo é mulheres com endometriose no diafragma (músculo que separa o abdômen do tórax) poderão apresentar dores no ombro direito durante a menstruação e perder anos tratando como se fosse um problema ortopédico, sem melhora. Na prática, todos os sintomas catameniais (que pioram durante a menstruação) nas mulheres em idade fértil devem ser notificados ao ginecologista”, comenta, afirmando que é o médico quem indica o melhor exame de imagem para cada paciente.  

A especialista ressalta que os diagnósticos por imagem receberam forte incremento nos últimos vinte anos e hoje já substituem o diagnóstico por meio da laparoscopia. E ressalta que pesquisas utilizando a inteligência artificial têm mostrado bons resultados para o diagnóstico da endometriose, por meio de dados estatísticos e do uso de métodos de imagem, particularmente ressonância magnética.  

Outras consequências - As complicações mais graves da endometriose são raras e envolvem a obstrução intestinal, levando a uma cirurgia de urgência ou o estreitamento e obstrução dos ureteres, com o comprometimento da função renal a longo prazo, o que é grave e irreversível.  

“Esta última condição pode ser silenciosa e não trazer sintomas específicos urinários, dificultando a sua detecção. Outra complicação muito importante da doença é a sensibilização central do cérebro à dor. Isto pode ocorrer quando a mulher passa tantos anos sentindo a dor crônica que, mesmo depois de tratada a causa, esta dor persiste como uma memória de dor a nível cerebral”, completa Ana Luisa.   



Dra Ana Luisa Alencar De Nicola - médica ultrassonografista especialista no diagnóstico da Endometriose. Graduada em Medicina pela Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública, fez Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia na Maternidade São Paulo e em Ultrassonografia no CETRUS-SP. Possui título de especialista em Radiologia pelo Colégio Brasileiro de Radiologia – CBR. É membro da comissão de Radiologia da Sociedade Brasileira de Endometriose.


FIDI - Fundação privada sem fins lucrativos que reinveste 100% de seus recursos em assistência médica à população brasileira, por meio do desenvolvimento de soluções de diagnóstico por imagem, realização de atividades de ensino, pesquisa e extensão médico-científica, ações sociais e filantrópicas.

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