Quem já morou no exterior sabe que a vida lá fora tem seus desafios. Alguns aparecem nos primeiros dias em terras estrangeiras - como se diz pão de sal em inglês?, existe farmácia 24 horas? - e podem ser superados com um pouco de esforço. Mas e quando o que incomoda é a solidão?
Sempre que vou falar do assunto, eu me lembro da
minha experiência no Oriente Médio. Solteiro, eu queria conhecer gente - “os
árabes são tão bonitos”, um amigo havia comentado. O difícil era por onde
começar se não existiam baladas gays e se os aplicativos de paquera eram
proibidos.
Lembro também das movimentadas ruas de Xangai e da
minha surpresa ao entender que era possível se sentir sozinho numa cidade com
25 milhões de pessoas. Ali, o maior obstáculo era a língua. Não se aprende
mandarim em pouco tempo. E nem se constrói uma relação com meia dúzia de
frases.
Na Austrália, aprendi que as 13 horas de
fuso-horário fazem a distância até o Brasil parecer ainda maior. E whatsapp ou redes sociais nem
sempre resolvem, pois se eu ligar para os meus amigos com a espontaneidade tão
boa e tão brasileira que nos conecta, vou acordar todo mundo.
Desafios assim nem sempre têm solução. Mas da
dificuldade podem surgir bons aprendizados.
“Nos três primeiros meses, eu aceito todos os
convites que recebo”, me aconselhou uma colega de trabalho acostumada à vida no
exterior. A dica me ajudou a descobrir lugares e interagir com pessoas que eu,
sozinho, não conheceria.
A distância cultural que separa oriente e ocidente
me fez perceber como posso ser parecido com latinos e europeus espalhados pelo
mundo. Encontrei, assim, bons amigos na comunidade de expatriados.
Saber que vou passar o final do ano com meus irmãos
ou que a amiga de Brasília vem me visitar em outubro me ensinou que planejar
pode ser uma forma eficaz de lidar com a saudade.
E se, mesmo com tudo isso, um pouco de solidão acaba
sendo inevitável, meu maior aprendizado foi entender que o esforço de adaptação
vale a pena e que, no final, o saldo é positivo.
João Filipe da Mata - escritor e vice-cônsul em Sydney, Austrália. Autor de "Filho da Mãe", publicado pela editora Much, já morou na Eslovênia, na Itália, nos Emirados Árabes, na China e no Sri Lanka
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