O uso crescente de aparelhos tecnológicos e redes sociais tem suscitado diversas discussões em todo o mundo, principalmente sobre como efetivar a privacidade e a proteção de dados pessoais dos indivíduos. No Brasil, desde 2022, o direito à proteção dos dados pessoais, inclusive nos meios digitais, é previsto como direito fundamental (artigo 5º, LXXIX da Constituição brasileira de 1988).
Nesse sentido, um dos principais pontos de atenção
é como a exposição de dados de crianças e adolescentes no mundo digital pode
afetá-los. A privacidade desses indivíduos pode ser exibida por meio de
imagens, vídeos ou dados pessoais (como nome, idade, endereço ou números de
documentos). As exposições podem ocorrer de diversas formas, incluindo de maneira
voluntária pelas crianças e adolescentes ou por seus pais. Além disso, as
empresas responsáveis por realizar o tratamento de dados pessoais podem fazê-lo
de forma inadequada ou excessiva. A depender da maneira da exposição e dos
dados que são compartilhados, podem existir diversos riscos vinculados para a
saúde física e mental das crianças e adolescentes. Alguns exemplos dos perigos
concretos que o mundo digital traz são os casos de pedofilia online e de ciberbullying.
No entanto, é inegável que o uso de tecnologias
digitais pode ser extremamente benéfico e, mais do que isso, essencial para o
uso e exercício de outros direitos, a exemplo da educação de crianças e
adolescentes. Nesse sentido tem-se como exemplo a Lei n. 14.533 de 2023, a
Política Nacional de Educação Digital (PNED), que busca aprimorar a inclusão
digital e a educação digital escolar (artigo 2º, incisos I e II). Além disso,
há inúmeros benefícios para esse público com a utilização da internet e dos
recursos digitais para fins de entretenimento e socialização.
Os desafios e riscos presentes no mundo digital são
variados, principalmente para crianças e adolescentes, que são considerados
vulneráveis e, por isso, destinatários de proteção ampliada pelo ordenamento
jurídico. A Constituição Federal brasileira de 1988 estabelece a
obrigatoriedade da proteção desses indivíduos no artigo 227. Outra legislação
relevante é a Lei n. 8.069 de 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA).
O supracitado artigo 227 da CF de 1988 prevê a
responsabilidade compartilhada entre a família, a sociedade e o Estado na
proteção das crianças, dos adolescentes e dos jovens, assegurando seus direitos
e protegendo-os de violências e negligências. A mesma ideia está contida no
artigo 4º do ECA, que reforça a necessidade de proteção ampla, realizada pela
família, comunidade, sociedade e poder público.
Assim, percebe-se que o ordenamento jurídico
brasileiro se preocupa em realizar uma proteção efetiva dos direitos de
crianças e adolescentes. Sobre essa proteção no mundo digital, algumas
legislações já existentes são relevantes.
A Lei n. 12.965 de 2014, conhecida como Marco Civil
da Internet (MCI), estabelece os princípios, garantias direitos e deveres para
o uso da internet no Brasil. O artigo 29 do MCI traz previsões com relação ao
controle parental sobre os conteúdos considerados impróprios para os filhos
menores, respeitando os princípios do próprio MCI e do ECA. Além disso, é
esclarecido que cabe ao poder público, aos provedores e a sociedade civil
fornecer informações e promover educação sobre os programas de computadores,
bem como possibilitar a inclusão digital de crianças e adolescentes.
Outro exemplo é a Lei n. 13.409/2018, a Lei Geral
de Proteção de Dados (LGPD) brasileira. A LGPD preceitua sobre o tratamento de
dados pessoais de crianças e adolescentes em seu artigo 14, esclarecendo que
tal tratamento deve ocorrer sempre considerando o seu melhor interesse.
Apesar das legislações mencionadas, o Poder
Legislativo compreendeu que são necessárias novas discussões e a criação de
legislação específica, voltada para a proteção de crianças e adolescentes em
ambientes digitais. É nesse sentido que está hoje em discussão o PL 2.628, de
2022.
A título comparativo, nos Estados Unidos da América
também estão surgindo vários projetos de lei estaduais que visam assegurar a
proteção da privacidade das crianças. Nos últimos anos, há iniciativas na
California (California’s Age Appropriate Design Code), Utah e Arkansas.
Há no país, por exemplo, discussões legais sobre a restrição da coleta de dados
pessoais de crianças e adolescentes, além da possibilidade de controle parental
sobre as mensagens desses indivíduos.
É inegável que há variados desafios no mundo
digital para crianças, adolescentes e adultos. Sendo assim, a discussão sobre
as melhores formas de tutelar crianças e adolescentes e os seus direitos à
privacidade e à proteção de dados pessoais é necessária e urgente. No entanto,
a questão deve ser respondida com razoabilidade, já que os extremos de
“proibição total” e “acesso livre” costumam ser prejudiciais.
A legislação, sozinha, provavelmente não será capaz
de proteger as crianças e adolescentes de maneira efetiva. Da mesma forma, não
é razoável pensar que os genitores ou responsáveis, sozinhos, serão capazes de
resguardar integralmente os seus filhos.
Conforme anteriormente mencionado, trata-se de
responsabilidade conjunta e é essencial que a sociedade, o poder público e a
família discutam sobre como proteger este público no mundo digital,
principalmente em razão de sua vulnerabilidade. É um processo que deve incluir,
por exemplo, campanhas de conscientização e o ambiente escolar.
No entanto, é inegável que a aprovação de
legislação mais robusta tem um papel fundamental para conscientizar e
estabelecer, de forma mais clara e com maior transparência, as
responsabilidades e sanções pelas possíveis violações aos direitos das crianças
e adolescentes.
É essencial que a sociedade se mobilize nessa iniciativa,
buscando soluções para o presente e o futuro. É provável que o uso dos recursos
digitais seja ainda mais fortalecido nos próximos anos. Desse modo, a única
alternativa viável é tornar a internet um ambiente mais seguro para que
crianças e adolescentes possam utilizá-la sem se colocar em risco, mas, ao
contrário, podendo usufruir das possibilidades benéficas do mundo digital.
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