sábado, 1 de abril de 2023

Envelhecimento populacional cria desafios para a humanidade

Mudança demográfica impacta sistemas de saúde, previdenciário e de cuidados para a terceira idade. Brasil está entre países que terão “pirâmides invertidas” 


O envelhecimento populacional, resultado da queda nas taxas de fecundidade e do aumento da expectativa de vida, impactará cada vez mais os sistemas de saúde, previdenciário e de cuidados para a terceira idade em grande parte dos países, inclusive o Brasil, alertam especialistas.

A situação é preocupante porque, ao mesmo tempo em que cresce o número de idosos, diminui a população economicamente ativa, composta por pessoas que estão no mercado de trabalho e geram riqueza para sustentar os mais velhos.

O Prof. Dr. Carlos Frederico Martins Menck, Biólogo membro da Academia Brasileira de Ciências e professor titular da Universidade de São Paulo (USP), aponta que muitos países – principalmente os desenvolvidos, mas também vários em desenvolvimento – caminham para ter pirâmides populacionais invertidas, com menos crianças e jovens na base e mais pessoas maduras e idosos do topo.

No Japão e em alguns países europeus, o envelhecimento populacional já é uma realidade. A idade média na Europa é de 41,7 anos, muito acima da idade média de 17 anos na África Subsaariana, segundo a Dra. Natalia Kanem, diretora executiva do Fundo de População das Nações Unidas (Unfpa).

O caso mundial de envelhecimento populacional mais emblemático, aponta Carlos Menck, é o da China, que décadas atrás adotou um estrito programa de natalidade, a política de um único filho por casal, que reduziu drasticamente o seu crescimento populacional. Segundo estimativas da ONU, a população da China no fim do século (estimados 771 milhões) será praticamente a metade da atual (1,425 bilhão).

Outro país que começa a envelhecer é o Brasil. Estima-se que a população atual de 215 milhões deve alcançar o pico de 231 milhões em 2047 e cair para 184 milhões no fim do século.

A Profa. Dra. Mercedes Maria da Cunha Bustamante, professora titular da Universidade de Brasília (UnB) e presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), avalia que o Brasil perdeu “uma janela demográfica importante de desenvolvimento”.

Ao longo das últimas décadas, nosso país gozou do chamado bônus demográfico, quando grande parte da população é adulta e jovem e está no mercado de trabalho – ou deveria estar. Essa janela já se fechou e o Brasil tende a envelhecer antes de se tornar desenvolvido.

“Vemos o mesmo em outros países. As taxas de crescimento populacional estão diminuindo, sem que eles tenham adotado políticas de Estado de preparação para as próximas décadas”, analisa Mercedes Bustamante. “Em países com sistemas previdenciários solidários, que é o caso do Brasil, quem paga a aposentadoria são as novas gerações. Quanto menos gente você tem na base da pirâmide, mais difícil é manter esse sistema funcionando”.

A humanidade chegou ao marco de 8 bilhões de habitantes no fim de 2022, resultado do crescimento exponencial nos últimos cem anos. Durante toda a Antiguidade, a população mundial aumentou muito pouco, chegando a um total estimado entre 150 a 250 milhões – os dados são imprecisos – na época de Cristo. Só no século 16 atingimos um contingente de 500 milhões de pessoas e, em torno de 1800, totalizamos o primeiro bilhão.

Na década de 1920 a população atingiu o marco de 2 bilhões e a partir daí acelerou rapidamente, principalmente no pós-Segunda Guerra Mundial – período conhecido como baby boom –, quando houve um aumento de um bilhão de habitantes a cada 10 ou 15 anos.

Segundo o relatório da ONU World Population Prospects 2022, o crescimento exponencial no período resulta da forte queda na mortalidade – a expectativa média de vida aumentou de 46 anos em 1950 para quase 73 em 2019 – combinada com altas taxas de fecundidade. A redução na mortalidade deve-se a um conjunto de fatores, como os avanços na saúde pública, nutrição, higiene pessoal, medicina e ciência – conquistas da humanidade que devem ser celebradas.

No entanto, a taxa anual de crescimento populacional atingiu o pico de 2,2% em 1964 e hoje é inferior a 1%. Demoramos 12 anos para aumentar de 7 para 8 bilhões, mas vamos precisar de 14,5 anos para chegar aos 9 bilhões em 2037, segundo o relatório.

A desaceleração no crescimento da população mundial é determinada pela queda na taxa média de fecundidade, de 5 nascimentos por mulher em 1950 para 2,3 nascimentos em 2021 e estimados 2,1 em 2050. Para que a reposição populacional seja assegurada, a taxa não pode ser inferior a 2,1, pois as duas crianças substituem os pais e a fração 0,1 é necessária para compensar os indivíduos que morrem antes de atingir a idade reprodutiva.

Segundo o modelo da ONU, a população mundial atingirá o pico de 10,4 bilhões na década de 2080 e deve ficar mais ou menos estável até o fim do século. Depois, pode haver um declínio, mas é difícil assegurar o que vai acontecer.

Mercedes Bustamante ressalta que os países mais pobres são os que continuam a apresentar elevadas taxas de fecundidade, enquanto os desenvolvidos pararam de crescer e, em vários casos, terão decréscimo populacional nas próximas décadas.

Os oito países com maior crescimento populacional até 2050 serão: Índia, Paquistão, Filipinas, Nigéria, República Democrática do Congo, Egito, Etiópia e Tanzânia, segundo o relatório da ONU.

O ranking dos dez países com maiores populações mudará bastante até o fim do século. Já em 2023, a Índia passa a China e torna-se a nação mais populosa do mundo. Em 2050, Nigéria e Paquistão vão igualar a população dos EUA.

Em 2100, a Índia terá o dobro da população da China; Nigéria, Paquistão e República Democrática do Congo terão mais habitantes que os EUA; o Brasil não estará mais no ranking dos dez mais; e a África Subsaariana concentrará um terço da população mundial.

“O crescimento populacional está se dando em países que ainda precisam se desenvolver e que têm demandas legítimas, o que coloca a questão de como se apoia esses países, de maneira que eles sigam rotas de desenvolvimento que não perpetuem os erros dos atuais países desenvolvidos. Entra a questão de como a gente deve apoiar esses países para que façam uma transição para a sustentabilidade e, ao mesmo tempo, suas populações tenham acesso a condições dignas”, ressalta Mercedes Bustamante.

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