quinta-feira, 2 de março de 2023

Nova regra portuguesa de arrendamentos é um ataque a propriedade privada?

Como a intervenção do Estado em questões privadas pode impactar a sua vida.


Há vários anos, o Estado português decidiu criar uma política de atribuição de Golden Visas para pessoas que comprassem casas acima de 500 mil euros. Esses vistos poderiam ser atribuídos mesmo a proprietários estrangeiros que não viviam em Portugal, o que equivaleria à cidadania europeia (não nacionalidade). Essa política fez disparar o número de imigrantes asiáticos que compraram casas para adquiri-lo.

Em paralelo, o Estado português implementou mais iniciativas que contribuíram para os impactos dos próximos anos. Listo duas delas:

  • a criação do estatuto de nômade digital (permitindo que um profissional trabalhasse em Portugal recebendo um salário de outro país – que tenha um salário médio maior – morando em Portugal); e
  • a isenção de impostos de pessoas que quisessem se aposentar em Portugal (o que aumentou o nível de aposentados no país que não pagavam impostos, mas que usufruíram os serviços sociais do país como um cidadão português que pagou impostos a vida toda).

Com isso, o Estado passou a arrecadar uma série de impostos, o que alavancou o mercado imobiliário português, aumentando, respectivamente, os valores para compra e aluguel de imóveis, principalmente, em Lisboa. Porém a economia, e consequentemente o salário médio do português, não acompanharam esse crescimento: hoje, comprar uma casa em Lisboa é um sonho cada vez mais distante para o cidadão local. Para piorar esse cenário, o valor do aluguel corresponde a um percentual cada vez maior do salário médio do português, o que significa que o custo com moradia pesa mais no orçamento, sobrando menos dinheiro para outros investimentos/custos, ou seja, a corda não estica.

Além de os preços dos imóveis em Lisboa terem subido representativamente em comparação com os anos anteriores, também são considerados altos quando comparados com os imóveis de outros países da União Europeia, como Madrid na Espanha (que possui uma economia e salário médio mais alto quando comparado com Portugal).

Ao notar que essa política está prejudicando os portugueses, o governo socialista atual demonstra sua preocupação com a situação, e sugere uma nova política para melhorar a vida das pessoas e “arranjar mais moradias” para locação. O plano é o seguinte: recomendar fortemente que os proprietários de casas vazias que estão tentando vendê-las há alguns anos, ou que fizeram reformas e rentabilizam através de locações de temporada ( AirBnb), aluguem seus imóveis por um valor máximo pré-fixado, de acordo com a localização (colocando um teto para o aumento dos valores). O plano é que esta regra vigore até para contratos já ativos, a partir de uma renegociação dos contratos e valores atuais a fim de determinar esse padrão por região. Além da questão de valores, o Estado também planeja intervir para que os proprietários parem de alugar suas casas por temporada e passem a locar no formato de renda permanente. “O Estado compromete-se a arrendar casas privadas pelo prazo de 5 anos, e só depois subarrendar, comprometendo-se a pagar renda aos proprietários, o que reduz o risco de incumprimento”) e impactará diretamente nos rendimentos dos proprietários oriundas da locação de seus imóveis. Além disso, o histórico de pagamentos do Estado Português não é dos melhores.

Além de todas essas limitações, os impostos de locação e/ou venda de imóveis em Portugal giram em torno de 28% do lucro no caso de venda de imóveis, e no caso de aluguel, o mesmo percentual é aplicado com base no valor total do arrendamento.

A fim de justificar esta estratégia, o líder socialista argumenta que “direito de propriedade não pode sobrepor-se a outros direitos fundamentais, como direito à habitação”. Familiar, não? A verdade é que a oposição e os empresários de economia e do mercado imobiliário português já se manifestaram contra e ainda se prevê muito debate sobre o tema nos próximos meses.

Respondendo à pergunta inicial e título deste artigo: A nova regra portuguesa de arrendamentos é sim um ataque à propriedade privada. O Estado já vinha intervindo há alguns anos, e agora mais ainda.

 

MINI BIO - Graduada em Administração de Empresas com MBA em Gestão Financeira, Controladoria e Auditoria pela FGV-SP.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário