Cientistas identificaram na espécie Beauveria caledonica potencial de controle biológico da broca e da fusariose, graves problemas fitossanitários de uma cultura de grande importância econômica nos trópicos e subtrópicos. Ação do microrganismo complementaria estratégias tradicionais de manejo em campo (foto: Jeanne Prado/Embrapa)
A praga da broca e a doença da
fusariose estão entre as mais importantes ameaças às bananeiras e seu controle
ainda é um grande desafio para os produtores. A broca é um besouro vulgarmente
conhecido como “moleque-da-bananeira” e provoca um efeito direto no rizoma
(caule subterrâneo capaz de emitir ramos e raízes), enfraquecendo o sistema
radicular da planta, reduzindo a absorção de nutrientes e causando perdas
significativas de produtividade. Os insetos adultos também podem ter um papel
na disseminação e aumento de infecções por patógenos de plantas. Já a
fusariose, também conhecida como “mal-do-Panamá”, causa graves perdas de
rendimento e se espalha rapidamente por vários meios.
Para mitigar seus efeitos é necessária uma combinação de práticas de
manejo em plantios comerciais, mas é muito importante a busca por alternativas
de controle biológico para complementar o manejo em campo. Um fungo ainda pouco
estudado no Brasil e no mundo que cumpre esse papel foi recentemente isolado
por um grupo que reúne cientistas da Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (Embrapa), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do
Bioversity International (Colômbia), com o apoio de pesquisadores da Agência
Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA, regional Vale do Ribeira) e do
Instituto Agronômico (IAC). O Beauveria caledonica foi
encontrado na região de produção comercial de banana no Vale do Ribeira, cerca
de 190 quilômetros a sudoeste da capital.
Trabalho apoiado pela
FAPESP e publicado na Pest Management Science descreve
a capacidade do Beauveria caledonica de
infectar e matar a broca-da-bananeira (Cosmopolites sordidus)
e de inibir o fitopatógeno Fusarium oxysporum f. sp.
cubense (FOC), causador da fusariose.
“A pesquisa demonstrou, pela primeira vez, o duplo papel desse fungo,
isolado de brocas-da-bananeira naturalmente infectadas, contra as duas
principais restrições fitossanitárias”, diz Jeanne Scardini Marinho-Prado,
agrônoma com doutorado em entomologia pela Universidade Federal de Viçosa e uma
das autoras do artigo. O grupo comprovou que, comparativamente, isolados
de B. caledonica se mostraram mais eficientes no
biocontrole de adultos da broca do que isolados de B. bassiana, espécie atualmente usada no combate
biológico do inseto em campo.
“Isolamos B. caledonica de adultos da
broca-da-bananeira coletados em campo e depois fizemos uma formulação em óleo
vegetal emulsionável, totalmente biodegradável, com seus conídios [esporos
responsáveis pela reprodução assexuada] para aumentar sua eficácia”,
explica Gabriel Moura Mascarin,
doutor em patologia de insetos e controle microbiano pela Escola Superior de
Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP) e pela
Crop Bioprotection Research (unidade de pesquisa vinculada ao Departamento de
Agricultura dos Estados Unidos).
Formulação
Mascarin é o primeiro autor do trabalho e principal responsável pela
formulação em óleo emulsionável avaliada no artigo. O óleo desempenha um papel
importante na adesão do fungo ao corpo do inseto, facilitando sua infecção. O
grupo de cientistas ainda descobriu que o fungo produz um composto secundário
chamado oosporina, que teve ação antagônica sobre o fungo patogênico FOC. “Esse
efeito antagonista de B. caledonica e
de seu metabólito oosporina sobre o fungo FOC é inédito”, diz Prado, que
atualmente é pesquisadora da Embrapa Meio Ambiente.
A oosporina foi detectada e quantificada usando as técnicas de
ressonância magnética nuclear e espectrometria de massa. Em ensaio in vitro contra o Fusarium,
verificou-se que os filtrados acelulares extraídos do caldo fermentado de B. caledonica contendo o composto oosporina
exibiram atividade antifúngica sobre os conídios, resultando em forte inibição
da germinação do fitopatógeno FOC.
“Neste estudo foi demonstrado que certos bananais comerciais infestados
pela broca-da-bananeira podem abrigar uma comunidade muito especializada de
espécies de fungos entomopatogênicos”, diz Prado. O solo é um importante
reservatório desses fungos que podem parasitar insetos, matando-os ou
incapacitando-os. “Por isso, compreender a interação entre C. sordidus e fungos entomopatogênicos, além de
entender como ambos podem estar relacionados a outros microrganismos no solo, é
crucial para o desenvolvimento de biopesticidas à base de fungos”, explica a
cientista, ressaltando que por enquanto não há produtos comerciais com B. caledonica.
Ainda
segundo a pesquisadora, o desenvolvimento de biopesticidas com linhagens mais
virulentas ao inseto-alvo, seja por seleção em laboratório, formulação, novas
estratégias de aplicação ou manipulação genética, pode tornar esse
microrganismo mais competitivo para uso em programas de manejo, contribuindo
assim para sistemas de cultivo de banana mais equilibrados.
O artigo é assinado por Mascarin, Prado e Márcia Regina Assalin (Embrapa
Meio Ambiente), Lucas Gelin Martins, Erik Sobrinho Braga e Ljubica Tasic (Unicamp),
Miguel Dita (Bioversity International, Cali, Colômbia) e Rogerio Biaggioni Lopes (Embrapa
Recursos Genéticos e Biotecnologia).
A íntegra do estudo Natural occurrence of Beauveria
caledonica, pathogenicity to Cosmopolites sordidus and antifungal activity
against Fusarium oxysporum f. sp. cubense pode ser acessada
em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/ps.7063.
Ricardo Muniz
Agência
FAPESP

Nenhum comentário:
Postar um comentário