terça-feira, 27 de setembro de 2022

Dia Nacional da Doação de Órgãos

Dentes também são considerados órgãos - Saiba como eles podem ser doados e suas possíveis utilizações

 

O Dia Nacional de Doação de Órgãos, celebrado em 27 de setembro, foi criado para conscientizar a sociedade sobre a importância da doação de órgãos. O Brasil está entre os maiores transplantadores de órgãos, tecidos e células do mundo. Porém, o que muitas pessoas não sabem é que o dente tecnicamente também é considerado um órgão e, como qualquer outro órgão do corpo humano, pode ser doado.

Seja o dente de leite que está caindo ou o permanente extraído, a sua doação é de extrema importância, por isso, não deve ser descartado. O indicado é encaminhar esse dente aos biobancos ou bancos de dentes, onde terá um destino apropriado. 

A Cirurgiã-Dentista e especialista em Implantodontia Dra. Claudia Pires Miguel lembra que a realidade da Odontologia brasileira no século passado consistia em peregrinar entre cemitérios para captar elementos dentários para estudos. “De acordo com o regulatório atual, as instituições de ensino de Odontologia precisam manter os seus próprios bancos de dentes ou buscarem parcerias para viabilizar a disponibilização deste nobre material para seus alunos, coibindo desta forma qualquer tipo de ação criminosa, como o comércio de órgãos dentais”. No entanto, ela explica que nem somente de dentes depende a pesquisa em Odontologia. “Materiais biológicos humanos, como pedaços de ossos, gengiva, saco pericoronário e demais tecidos biológicos que contêm, inclusive, DNA, podem ser armazenados em biobancos”. 

Outra modalidade de armazenamento de material biológico citada pela Implantodontista   são os Centros de Processamento Celular (CPC), que processam e armazenam células humanas para utilização futura (autólogo ou homólogo). Os CPCs podem ser públicos ou privados, já os biobancos, incluindo os bancos de dentes, são exclusivamente sem fins lucrativos e em geral estão ligados a uma instituição de ensino ou de pesquisa. 

“Uma característica de um CPC é que, diferentemente de um Banco de Dentes, no CPC as células são armazenadas “vivas”, ou ao menos com potencial de viabilidade, podendo retomar à atividade celular. Portanto, a coleta do material pressupõe ausência total de contaminantes (sem cáries ou tártaro, no caso de células coletadas nos dentes) e, uma vez coletado, o material precisa ser colocado em um recipiente estéril com um líquido especial, cheio de nutrientes, fornecido pelo próprio CPC. Por isso, esta coleta precisa ser programada com antecedência”.

 

Como é feita a doação de dente 

Para a doação de dentes ou material biológico aos bancos de dentes e/ou biobancos, Dra. Claudia explica que o material em geral é acondicionado em um frasco limpo, contendo água limpa, que deve ser trocada uma vez por semana até a entrega para a doação. Alguns bancos também recomendam o uso de água destilada ou soro fisiológico. 

Para todos os casos de doação de material biológico é preciso enviar também o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) assinado pelo paciente e/ou seu responsável (quando paciente menor de 18 anos). Um Termo de Assentimento (TA) também é recomendado para que as crianças também tomem conhecimento e permitam a doação do seu material para uso em pesquisa e/ou para fins didáticos. 

Dra. Claudia lembra que a colega, implantodontista e assessora técnica do Conselho Federal de Odontologia na área de células, sangue, tecidos e órgãos junto à Anvisa, Dra. Moira Pedroso Leão, costuma ressaltar que as leis, resoluções e demais normas regulatórias no setor acompanham uma tendência mundial em viabilizar o uso do material biológico para a prática da medicina regenerativa e permitir estudos na área da genética. “A literatura científica mostra que pedaços de dentes autólogos já foram usados de forma bem-sucedida para recuperar a visão de pacientes cegos em uma técnica conhecida por Osteo-Odonto-Queratoprótese Modificada”, compartilhou Dr. Moira. 

Mais recentemente, a implantodontia, periodontia e a cirurgia têm utilizado a dentina particulada (também autóloga) como um enxerto que serve de arcabouço para formação de novo tecido ósseo. De acordo com Dra. Claudia, os transplantes dentários autógenos, quando um dente é deslocado de um local para outro, popularizaram-se no Brasil na década de 1980, seguindo um protocolo estabelecido há mais de 42 anos nos países escandinavos.

 

Condições para o sucesso do transplante 

Para aumentar as chances de “pega” do transplante dentário, a Implantodontista informa que é fundamental que o dente esteja saudável e que seja removido de um local e transplantado imediatamente para o outro local, no mesmo paciente, ou seja, é uma técnica que deve ser sempre autóloga. “Em um transplante homólogo, em pacientes diferentes, teriam de ser removidas todas as células diferenciadas (como as de ligamento) para evitar a ativação do sistema imunológico, o que inviabiliza a técnica. Dentes transplantados na fase de rizogênese (processo de formação da raiz dentária) têm um prognóstico melhor do que os completamente formados”. 

Dra. Claudia acrescenta que nos dentes transplantados com rizogênese completa pode acontecer a necrose pulpar, o que indicaria a necessidade de tratamento endodôntico. Ou seja, nos transplantes de dentes com raiz formada, o tratamento de canal é indicado em todos os casos. 

Os transplantes têm demonstrado um percentual de sucesso razoável, principalmente quando aplicados nos casos de terceiros molares inferiores transplantados na posição dos primeiros molares condenados. “Um ponto importante deve ser ressaltado: os transplantes dentários não se contrapõem aos implantes. Os transplantes dentários têm indicações muito específicas para alguns casos de anodontia parcial (situações em que não há a formação de todos os dentes esperados) e como solução de traumatismo seguidos de perda dentária, especialmente em pacientes jovens. A limitação dos transplantes dentários em relação aos implantes também está relacionada à disponibilidade de órgãos dentários nos pacientes que possam ser transplantados”. 

Quanto às atividades dos CPCs, levantadas pela Dra. Claudia junto à Dra. Moira, com a descoberta de que células-tronco estão presentes nos tecidos dentários abriu-se um novo campo de atuação para o Cirurgião-Dentista, que pode atuar como protagonista na coleta e aplicação de material biológico processado para uso em medicina regenerativa. 

Segundo Dra. Claudia, não importa se é o dente é decíduo (dente de leite) ou permanente, as células isoladas podem ser multiplicadas e usadas para o mesmo paciente (autólogo) ou para pacientes diferentes (homólogo), pois diferentemente das células diferenciadas, as células-tronco não são capazes de induzir resposta imune, pois em sua superfície não estão presentes os antígenos leucocitários, as proteínas que sinalizam que há um “estranho” no organismo. “Em termos práticos, podemos afirmar que as células-tronco são células que tem o potencial de recompor tecidos danificados e, assim, auxiliar no tratamento de doenças como o diabetes, Parkinson, Alzheimer, doenças degenerativas e autoimunes, assim como as doenças cardíacas, vasculares e sequelas de Acidente Vascular Cerebral (AVC)”. 

Dra. Claudia conclui com a ponderação de que, com a finalização do arcabouço regulatório em 2021, devemos vivenciar a implantação do uso de células em terapias celulares avançadas de agora em diante, tanto na área da Odontologia quanto em suas aplicações nas diversas especialidades da Medicina.

 

  

Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP)

www.crosp.org.br



Fontes:

Regulatório – Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997, Decreto nº 2.268, de 30

de junho de 1997, Código Civil Brasileiro. Lei nº 10406, de 10 de janeiro de

2002, Lei nº 10.211, de 23 de março de 2001, altera dispositivos da

Lei nº 9.434. Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005. RDC/Anvisa - 508/2021.

 

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