segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

A árdua jornada ao universo das doenças raras


Enquanto a maioria dos indivíduos desfrutam a experiência de viver em um mundo baseado na inovação, na conectividade e na agilidade, pacientes com doenças raras parecem fazer parte de outro planeta. Nesse território “paralelo”, além dos desafios diários inerentes à condição que enfrentam - muitas vezes até para executarem tarefas consideradas simples, como andar e comer -, os habitantes precisam lidar com dificuldade para diagnóstico e, principalmente, com a incerteza sobre a existência de uma terapia capaz de, ao menos, frear a evolução da doença, a dificuldade para ter acesso ao medicamento e a demora para iniciar o tratamento. Tão grande quanto esses obstáculos é o tamanho dessa população. São 13 milhões de pessoas somente no Brasil.

Ainda que o universo dos raros tenha evoluído muito nos últimos anos, com um número maior de profissionais de saúde devidamente capacitados, que conhecem e tratam essas enfermidades, com associações de pacientes dando suporte e parlamentares sensíveis à causa, buscando por mais políticas inclusivas, é inegável que as doenças raras continuam ainda precisando de mais acesso aos tratamentos. Basta olharmos para o baixo número de protocolos e de produtos incorporados no Sistema Único de Saúde (SUS), de 3 a 5% das doenças genéticas raras possuem tratamentos que barram o avanço da doença de base, mesmo assim nem todos os tratamentos são incorporados.

Isso acontece porque, mesmo que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) seja reconhecidamente um dos melhores órgãos regulatórios do mundo para aprovação de tratamentos, ainda existem entraves burocráticos para fazer com o os tratamentos cheguem aos pacientes. A Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) e a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) atuam de maneira desconexa, com base em resoluções que deveriam ser revistas para a precificação de terapias e para a incorporação de medicamentos no SUS, respectivamente. Tal atraso muitas vezes desestimula a entrada de novas tecnologias beneficiando os pacientes.

Algumas vezes os procedimentos levam anos, quando deveria ser resolutivos meses. O impasse dificulta a incorporação no SUS para enfermidades raras. Deixando assim os pacientes desassistidos.

Considerando que a tecnologia continua evoluindo, inclusive com o desenvolvimento de terapias gênicas, fica clara a importância de rever a rota e de mudar os procedimentos, ou mesmo revê-los, para não perder de vista o universo das doenças raras, bem como suas janelas de oportunidade únicas para tratamento. Há diversas evidências que mostram os benefícios dos medicamentos inovadores para os pacientes e para o País, como o aumento da expectativa de vida dos meninos com distrofia muscular de Duchenne, que antes morriam perto dos 20 anos e, agora, com o tratamento correto, conseguem ultrapassar essa marca e serem mais proativos social e economicamente.

Temos um grande desafio, mas possível de ser solucionado com o apoio das associações de pacientes, dos profissionais de saúde, do governo e, porque não, da indústria. Trabalhando em conjunto, todos ganham.

 

 

Mônica Aderaldo - presidente da Federação das Associações de Doenças Raras do Norte, Nordeste e Centro Oeste (FEDRANN)


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