A escrita é um processo simbólico, uma construção que revolucionou o pensamento e está inserida na formação do ser humano.
Escrever é um ato complexo e baseado em inúmeros processos
neurológicos.
Ao longo da história da humanidade, a escrita das letras passou
por mudanças consideráveis, desde a adoção das letras góticas nos anos 500 d.C.
(uso da pena), permeando pela escrita escolar e caligráfica, até chegar à
escrita contemporânea (escrita mais livre e com diversidade de materiais, como
lápis, canetas esferográficas e papel), sem falar que, por muito tempo, uma boa
caligrafia já foi associada a um alto nível de instrução.
No Colégio Presbiteriano Mackenzie, antiga Escola Americana, o uso
da caligrafia mackenzista era uma marca registrada dos alunos e professores que
passaram pelas suas salas de aula até os anos 90.
Com características peculiares da caligrafia americana --
especialmente na grafia das iniciais maiúsculas do alfabeto --, a escrita
cursiva mackenzista era facilmente reconhecida em diferentes contextos,
atribuindo-lhes a singularidade de uma leve inclinação à direita, destacando a
origem da caligrafia amplamente ensinada, com livros de autoria própria, para a
execução correta dos movimentos.
Atualmente, porém, o valor da escrita à mão tem sido debatido nos
círculos acadêmicos. Mais precisamente neste século 21, a discussão sobre o uso da letra cursiva tem reverberado de forma
considerável no cenário educacional mundial.
Em 2015, países como a Finlândia e alguns estados americanos já se
pronunciavam a respeito da possível exclusão desse “conteúdo” devido à expansão
das ferramentas digitais presentes dentro das salas de aula, apontando o ensino
da “letra de mão” como algo obsoleto para os tempos atuais.
Com a pandemia e a implantação do ensino remoto, o debate veio à
tona novamente, reduzindo-se a caligrafia a um ato mecânico, que precisaria
ceder espaço para o aprendizado de outras competências, como a navegação por
meio de recursos digitais.
Alguns especialistas entendem que o ensinamento da letra cursiva pode
ser ineficiente e segregador, e apresentam o fato de que muitas crianças com
excelente aproveitamento acadêmico foram rotuladas por não apresentarem uma
letra cursiva legível ou “bonita”.
Outros profissionais afirmam que a caligrafia em letra cursiva é
uma habilidade não mais essencial, já que, nos dias atuais, com a existência
das teclas, a escrita com lápis, caneta e papel tornou-se anacrônica.
Diante das discussões acaloradas sobre o uso da letra cursiva,
estudos e especialistas dividem opiniões, mas uma significativa parcela advoga
em favor da continuidade do ensino da letra cursiva e do traçado das letras,
apontando habilidades e benefícios especiais para as crianças.
Segundo os estudos da professora de Psicologia Educacional, da
Universidade de Washington, Virginia Beringer, escrever à mão, formando letras,
envolve a mente e isso pode ajudar as crianças a prestarem atenção à linguagem
escrita. Ela também argumenta que “a caligrafia e a sequência dos traços
envolvem a parte pensante do cérebro”.
Berninger ainda registra que os estudos realizados com a
caligrafia têm por objetivo defender a formação de crianças que sejam
escritoras híbridas, ou seja, utilizando primeiramente a letra de forma para a
leitura, auxiliando o reconhecimento das letras na educação infantil, depois
com o uso da letra cursiva para a escrita e composição dos textos e, apenas ao
final da séries iniciais do ensino fundamental, a digitação.
Recentemente, um estudo publicado na Revista Nature, em 26
de março deste ano, intitulado “Hight performance brain to text
communication via handwriting”, abordou o impacto da caligrafia no cérebro
e sua importância cognitiva como uma habilidade a ser desenvolvida ainda nos
dias de hoje, mesmo com todo o aparato tecnológico.
A escrita em letra cursiva traz inúmeros benefícios, pois ela
permite a continuidade do pensamento por meio do traçado uniforme e ligado,
promovendo fluência e imprimindo velocidade ao ato de escrever. Há vantagens no
aprendizado ortográfico e na composição das palavras, frases e textos,
favorecendo a memorização, a concentração, o foco e auxiliando na produção de
textos mais coesos, assim como constitui um componente importante no
desenvolvimento de uma escrita pessoal.
Entende-se que, no atual cenário socioeducacional, há a
necessidade de se repensar sobre o uso da escrita cursiva no que diz respeito
aos extensos exercícios de cópias, sem nenhuma reflexão sobre o que está sendo
feito, mas podemos otimizá-lo da melhor forma.
É compreensível o ajuste sobre qual tipo de letra usar para casos
específicos, como por exemplo, os alunos com necessidades especiais, para quem
a demanda do ensino e uso da letra manuscrita seria fator desagregador no
processo de ensino-aprendizagem.
Considerando-se os estudos e pareceres nos círculos acadêmicos, a constatação dos benefícios elencados e as prerrogativas sobre a importância da escrita à mão, compreende-se que a apresentação da letra cursiva e o ensino do traçado das letras à mão devam ser mantidos nas escolas, destacando seu valor cognitivo e educacional na vida acadêmica das crianças.
Andréa
Fanton - coordenadora do
2º ao 5º ano do Colégio Presbiteriano Mackenzie Tamboré.
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