Ainda existem muitas controvérsias sobre a exigência de vacinação de trabalhadores aqui no Brasil. É fato que a Lei 13.979/20, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente da covid-19, torna a vacinação compulsória (art. 13), o que não é novidade, pois desde 1975 já existe a previsão de vacinação compulsória no programa nacional de imunizações (Lei 6.259/75).
O
Supremo Tribunal Federal, ao julgar as ADI 6586 e 6587 e no recurso
extraordinário 1267879, firmou entendimento que a vacinação é obrigatória, mas
não forçada, o que significa dizer, em resumo, que o cidadão pode recusar a
vacina, mas pode sofrer restrição ao exercício de certas atividades ou à
frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei.
Uma
das questões conflituosas que a pandemia também trouxe é a possibilidade de a
empresa ter acesso a dados pessoais de trabalhadores vacinados, por meio de
plataformas virtuais das secretarias de saúde.
Em
Fortaleza, por exemplo, com o número de CPF e a data de nascimento – dados que
toda empresa possui em relação aos seus empregados –, é possível ter acesso ao
cartão de vacinação virtual de uma pessoa.
O
Ministério do Trabalho editou a Portaria 620/2021, em 1º de novembro de 2021,
que, em linhas gerais, determina que ao empregador é vedado exigir comprovante
de vacinação para acesso ou manutenção no emprego, configurando-se tal prática
como discriminatória (art. 1º, §1º e 2º), facultando-se alternativamente a
testagem para acesso ao local de trabalho.
A
questão controvertida é que o comprovante de vacinação é um dado pessoal
sensível, de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), por se tratar
de um dado relativo à saúde do trabalhador (art. 5º, II).
A
pesquisa que a empresa faz a esse banco de dados, de fácil acesso, para extrair
um dado pessoal sensível, configura-se como violação da privacidade do
trabalhador?
Há
casos que tratam de questões semelhantes, ainda em julgamento, no âmbito do
TST, sobre, por exemplo, a (im)possibilidade de empresas consultarem dados
financeiros de candidatos a emprego, em banco de dados creditícios. Na lei dos
transportadores autônomos de carga, por exemplo, há restrição clara a esse tipo
de consulta (art. 13-A da Lei 11.442/07).
O
respeito ao direito fundamental à privacidade do trabalhador impõe que seja o
trabalhador a decidir informar ou não (e nesse caso arcar com o ônus dessa
decisão) acerca da sua vacinação.
O
debate que propomos levantar, portanto, não se refere especificamente à
exigência ou não da vacinação para fins de acesso ou permanência no local de
trabalho, mas à possibilidade de acesso fácil a dados pessoais sensíveis das
pessoas, sobre sua saúde e vacinação, o que viola a intimidade do empregado,
fere a LGPD e deve ser urgentemente readequado de modo que somente o titular do
dado tenha acesso a esse.
Eduardo Pragmácio Filho - advogado,
membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho
Ana Virginia Moreira Gomes - professora
do Centro de Ciências Jurídicas e do Programa de Pós-graduação em Direito
Constitucional da Unifor.
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