Dados analisados
em ambulatório de hospital apontam que 90% dos pacientes entre 24 e 76 anos
apresentam fadiga e 85% teve uma grande perda de massa muscular
Uma doença complexa, sistêmica e imprevisível.
Esses desafios que fizeram parte da maioria das pesquisas para compreender o
comportamento do coronavírus logo no início da pandemia, agora se refletem
também na busca por explicações para os sintomas que permanecem em alguns
pacientes da Covid-19 por meses. Distúrbios cardiovasculares, metabólicos,
gastrointestinais, neurológicos, anemia, dores e cansaço são algumas das
sequelas observadas por um dos maiores estudos sobre isso publicado em abril na
revista Nature. De acordo com os pesquisadores norte-americanos, os pacientes
da Covid-19 tendem a continuar demandando recursos de saúde devido a essa série
de manifestações clínicas.
O cenário é muito semelhante ao observado pelos
profissionais de saúde e pesquisadores no ambulatório montado pelo Hospital
Universitário Cajuru, em Curitiba (PR), em parceria com a PUCPR, para
tratamento e estudo das sequelas pós-Covid. O espaço oferece atendimento de
pneumologia, fisioterapia respiratória e funcional, psicologia, neuropsicologia
e cardiologia dependendo da necessidade dos pacientes que são encaminhados pelo
SUS, além de servir como ambiente acadêmico para pesquisas sobre a
doença.
De acordo com os dados alcançados e analisados em 4
meses de serviço, 90% dos pacientes entre 24 e 76 anos apresentam fadiga, 85%
teve uma grande perda de massa muscular, 70% dispnéia e 50% cefaléia. São
sequelas que permaneceram mesmo após um mês de recuperação da Covid-19. “Logo
no começo da pandemia nós percebemos que seria necessário um espaço
especializado para tratamento das possíveis sequelas da Covid-19 nos pacientes.
Certos disso, criamos o ambulatório para prestar atendimento gratuito aos
pacientes e ainda contribuir com os avanços das pesquisas, ajudando a mapear o
vírus e as sequelas mais comuns e severas da doença. O ambulatório une serviço,
pesquisa e educação”, diz a pesquisadora do ambulatório, Cristina Baena.
Confira algumas das sequelas que pesquisadores ao
redor do mundo estudam atualmente para entender se são temporárias ou
permanentes:
Demência: O comprometimento neurológico
causado pelo coronavírus pode ser grande. Uma das explicações é que o vírus
penetra no sistema nervoso central, afetando neurônios e células da glia,
induzindo várias patologias como isquemias, sangramentos, dores de cabeça,
tonturas e perda do olfato. Algumas pesquisas levantam a possibilidade de danos
cognitivos nos pacientes. “A doença de Alzheimer tem como fisiopatologia uma
resposta inflamatória, assim como o coronavírus. Isso significa que a Covid-19
pode acelerar o processo de inflamação no sistema nervoso central e, por
consequência, acelerar um quadro demencial latente”, explica o neurologista dos
hospitais Marcelino Champagnat e Universitário Cajuru, Carlos Twardoswchy.
Doenças hepáticas:A Covid-19
pode afetar o fígado de duas formas: uma semelhante a uma hepatite e outra, à
uma colangite. Em relação ao padrão de colangite, sabe-se que as células das
vias biliares têm uma quantidade semelhante de receptores para entrada do vírus
(ACE2) que as pulmonares. Desta forma, a Covid-19 pode afetar com bastante
agressividade o fígado, especialmente se o paciente já tiver alguma doença
hepática crônica. “As queixas podem ser icterícia (“amarelão”), coceira,
náuseas e evoluir com a descompensação da doença hepática crônica, aumentando a
taxa de mortalidade”, explica o hepatologista dos hospitais, Jean Tafarel.
AVC e trombose: O
cardiologista e intensivista da UTI Covid do Hospital Marcelino Champagnat,
Paulo Negreiros, explica que pacientes hipertensos correm mais riscos de
desenvolver tromboses após a infecção da Covid-19. “O coronavírus desregula a
pressão dos hipertensos, mesmo com uso de medicamento. O vírus pode facilitar a
formação de coágulos, que levam à possibilidade de evoluir para complicações
como AVC e infarto”.
TOC: Estresse pós traumático, transtornos de ansiedade e
depressão também têm sido comuns em pacientes que ficaram mais tempo internados
para o tratamento da Covid-19. Além disso, os casos de transtornos obsessivos
compulsivos (TOC) também têm se tornado frequentes na população, devido à
necessidade da higienização constante das mãos, objetos e superfícies. “O medo
da contaminação causa em muitas pessoas a preocupação excessiva em passar
álcool em gel nas mãos, limpar compras do mercado, chegando a afetar de maneira
negativa a rotina. E isso é ainda mais impactante nos pacientes que passaram
por internações e vivenciaram momentos de incerteza nos hospitais, longe dos
familiares”, conta a psicóloga Rosane Melo Rodrigues.
Perda de massa
muscular: de acordo com
dados do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de
Saúde (Proadi-SUS), a duração média da internação hospitalar pela Covid-19 é de
22 dias. Além do cansaço emocional, todo esse tempo em um leito de hospital
também gera outro grande problema aos pacientes: a perda de massa muscular. “Os
internados apresentam diversas alterações de funcionalidade tanto da
musculatura respiratória quanto da musculatura periférica, em membros
superiores, inferiores e também têm sua capacidade cardiorrespiratória
comprometida pelo alto tempo de internação", explica a fisioterapeuta do
ambulatório pós-Covid do Hospital Universitário Cajuru, Maria Leonor Gomes de
Sá Vianna.
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