Algumas das novas mudanças têm causado estranhamento em profissionais da área. Especialista explica cada ponto.
A Resolução
CFM Nº 2.294/2021, que acaba de ser
publicada, trouxe novas regras para a Reprodução Assistida (RA) no Brasil. A
nova norma tem novidades em questões relacionadas à idade dos pacientes,
preservação e transferência de embriões, doação de gametas e barriga
solidária.
A seguir, a especialista
em Reprodução Assistida, Cláudia Navarro, diretora clínica da Life Search,
comenta sobre o que mudou e por que os casais que vão passar pelo processo de
RA precisam estar atentos às novas normas.
Número de embriões
fecundados
Como era? Não havia um limite
expresso na resolução. O número total de embriões gerados em laboratório era
comunicado aos pacientes para que decidissem quantos embriões seriam
transferidos a fresco, e quantos seriam criopreservados.
Como ficou? Agora, o número total de
embriões gerados em laboratório não
poderá exceder a oito. O restante da norma permanece: será
comunicado aos pacientes para que decidam quantos embriões serão transferidos a
fresco, obedecendo aos limites da resolução, e os excedentes viáveis serão
criopreservados.
Por quê? “Essa mudança está sendo
muito questionada pelos profissionais e entidades ligadas à reprodução humana.
Foi uma alteração feita pela plenária do CFM sem conhecimento da Câmara Técnica
de Reprodução Assistida. Os profissionais entendem que esta mudança irá limitar
os resultados, principalmente porque o resultado da fecundação de óvulos é
muito variável entre as pacientes, principalmente com relação a idade. Neste
caso, as pacientes serão as principais prejudicadas, principalmente aquelas de
idade avançada”, explica Cláudia Navarro.
Limite de transferência de
embriões
Como era? Mulheres até 35 anos
podiam transferir até dois embriões por vez. Mulheres entre 36 e 39 anos, até
três embriões. E mulheres com 40 anos ou mais, até quatro embriões.
Como ficou? Mulheres com até 37 anos
podem transferir até
dois embriões. Mulheres com mais de 37, até três. Em caso de
embriões euploides ao diagnóstico genético, ou seja, aqueles que após pesquisa
genética demonstraram estar com número correto de cromossomos, o limite são dois embriões,
independente da idade da mulher.
Por quê? “O objetivo da Reprodução
Assistida é sempre uma gravidez única (de um só feto). Esse ajuste nas idades e
limites foi feito com o intuito de se diminuir o número de gestações múltiplas,
que podem levar a complicações maternas e fetais”, contextualiza a médica. “Com
o desenvolvimento científico e a possibilidade de se conseguir embriões de cada
vez melhor qualidade, a tendência mundial é que se transfira menores números de
embriões. Como a idade da mulher é um importante marcador das chances de
gravidez, mulheres com idades mais avançadas podem receber um maior número de
embriões”, explica.
Limite de idade para
doação de gametas
Como era? A idade limite para a
doação de gametas era de 35 anos para a mulher e de 50 anos para o homem.
Como ficou? O limite passou a ser 37 anos para a mulher e
de 45 anos para o homem.
Por quê? “Aqui entendemos que o
ideal é que a doadora seja o mais jovem possível, mas evidências
científicas mostram que os gametas femininos até 37 anos ainda estão saudáveis
o suficiente para uma doação. Um dos pontos que levou a essa mudança é a
dificuldade em encontrar doadoras. Ampliando-se a idade, amplia-se o leque.
Entendo ser importante que a receptora seja informada da idade da sua doadora”,
comenta. “Por outro lado, as pesquisas têm mostrado que a idade paterna também
influencia na saúde do concepto, daí a redução de cinco anos para homens”,
acrescenta Cláudia Navarro.
Barriga solidária
Como era? A cedente temporária do
útero deveria pertencer à família de um dos parceiros em parentesco
consanguíneo até o quarto grau. Considerando primeiro grau sendo mãe e filha;
segundo grau, avó ou irmã; terceiro grau, tia ou sobrinha; e quarto grau,
prima.
Como ficou? O grau de parentesco
permanece o mesmo! Entretanto, a nova regra pede que a barriga solidária tenha ao menos um
filho vivo.
Por quê? “O fato de já ter um filho
(consequentemente uma gravidez saudável), teoricamente diminui as chances de
uma complicação gestacional”, diz.
Descarte de embriões
abandonados
Como era? Os embriões
criopreservados e abandonados por três anos ou mais poderão ser descartados.
Como ficou? Acrescentou-se a
necessidade de autorização
judicial para o descarte.
Por que? “Entende-se por embrião
abandonado aquele em que os responsáveis descumpriram o contrato
preestabelecido e não foram localizados pela clínica. Esse é outro ponto que
está sendo muito discutido pelas entidades e profissionais de RA. A Lei de
Biossegurança, uma Lei Federal, permite o descarte sem autorização judicial.
Vamos aguardar e ver se haverá alguma alteração”, acrescenta a médica.
Movimento natural
Até então, a norma mais
recente válida havia sido publicada em 2017. Com exceção de um ajuste, em 2020,
que excluiu do artigo sobre os pacientes da RA o trecho que citava a objeção de
consciência do médico em relação ao tratamento para casais homoafetivos. O novo
texto ainda acrescentou pessoas trans. A nova norma de 2021 manteve o ajuste.
De tempos em tempos, as
entidades buscam revisar suas normas a partir de novas evidências científicas,
mudanças na sociedade ou mesmo falhas que foram percebidas com o tempo. “Esse é
um movimento natural e importante para a sociedade”, diz Cláudia Navarro.
Cláudia Navarro - especialista em reprodução
assistida, diretora clínica da Life Search e membro das Sociedades Americana de
Medicina Reprodutiva - ASRM e Europeia de Reprodução Humana e Embriologia –
ESHRE. Graduada em Medicina pela UFMG em 1988, titulou-se mestre e doutora em
medicina (obstetrícia e ginecologia) pela mesma instituição federal.
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