Opinião
Imagine que um dia, ao levantar, todas as suas
experiências e trajetória são completamente apagadas da sua memória. Tudo
aquilo que você aprendeu, seus erros e acertos, são completamente esquecidos. E
mesmo assim, você precisa seguir em frente. Trabalhar e aprender tudo de novo.
Na Educação brasileira, muitas iniciativas e boas práticas mudam de rumo ou não
sobrevivem às trocas de gestão. Muitas vezes, aquilo que foi planejado e
cuidadosamente implementado pela gestão anterior é descontinuado. Os
investimentos e os anos de trabalho são desperdiçados.
Assim, a transição de governos exige
responsabilidade. Na Educação, bons resultados não surgem de uma hora para
outra. A continuidade e o aperfeiçoamento de projetos e políticas são
essenciais para impactar positivamente e de forma consistente a aprendizagem e
o futuro dos estudantes. Um exemplo disso é o Fundeb, que não teria se tornado
realidade sem o seu antecessor - o Fundef. Isso também vale para o Ideb. Se o
seu precursor, o Saeb tivesse sido descontinuado, não teríamos hoje esse índice
tão importante para a avaliação da Educação.
A Educação é, necessariamente, um processo de longo
prazo. Ela ocorre, muitas vezes, em processos geracionais. Está sujeita a
mudanças nos costumes, na moral da sociedade, na tecnologia, e assim por
diante. O fato é que cidadãos são constituídos a partir da Educação. É ela que
fundamenta o exercício de cada um de nós na sociedade. Se há uma gestão, uma
política pública que deve ter o maior cuidado, a maior parcimônia em sua
interrupção ou sua modificação, é a Educação. Ela representa o próprio poder
evolutivo de uma sociedade.
E os gestores públicos, os secretários da Educação
têm essa imensa responsabilidade. Pode haver uma alternância de poder, mas o
compromisso que a sociedade tem com a Educação de qualidade não pode ser
interrompida. Se houve desvios na gestão anterior, que sejam corrigidos, mas
todos os méritos devem ser reconhecidos.
Por isso, participar de uma transição política
ética e harmoniosa, pautada por valores morais, em que o bem comum esteja acima
de concorrências políticas, é um primeiro passo para a trilha do
desenvolvimento social. Transcender as diferenças políticas e ideológicas, bem
como manter um ambiente de diálogo, escuta ativa e colaboração mútua entre os
que chegam e os que deixam seu legado, dentro dos cargos de secretarias e prefeituras
é, sem dúvida, uma atitude real de compromisso social. O compartilhamento de
informações entre a gestão que inicia e a que termina colabora na implantação
de um plano de governo mais efetivo – e assumir posturas de resiliência,
diplomacia e cooperação são determinantes para atender o real motivo da função
pública: o bem-estar da população.
Neste momento de transição política, mais do que
nunca, é preciso que os gestores educacionais estejam abertos a uma gestão
horizontalizada, na qual a colaboração é o eixo norteador, promovendo um
trabalho em rede. Os movimentos de colaboração entre municípios, sejam eles na
forma de Câmaras Técnicas de Consórcios, Arranjos de Desenvolvimento da
Educação, ou mesmo fóruns e colegiados, constituem importantes espaços para
endereçar projetos comuns, em favor da Educação pública. A partir da
instituição de uma rede de colaboração, os dirigentes municipais e equipes
passam a atuar de forma conjunta, visando superar desafios comuns às suas
redes.
Ao atuar em redes, os gestores da Educação atuam
com uma visão sistêmica e transpartidária. Assim como a política não é para
qualquer um, segundo o ex-presidente da República Checa, Václav Havel - e
pressupõem um desapego muito grande, o gestor de Educação deve ter um
compromisso ainda maior com a integridade da gestão pública em função da sua
responsabilidade de longo prazo com a sociedade.
Mas os grandes planos e metas das iniciativas que
ocorrem em regime de colaboração, que beneficiam tantos estudantes brasileiros,
só se tornarão realidade se houver atendimento às leis, organização prévia e
liderança. A qualidade da transição desse governo depende de cada um de nós. A
continuidade das ações realizadas em regime de colaboração também.
Maria Paula Mansur Mäder - doutora em Educação e
coordenadora de produção e disseminação de conhecimento do Instituto Positivo.
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