Psicóloga
percebeu aumento de 90% de novos pacientes durante período, e a maioria vem
trazendo temas de família.
Após
mais de um mês em quarentena, não é novidade para ninguém que as relações entre
pessoas isoladas estão sendo um grande desafio. Porém, mais do que aliar
trabalho remoto ou a falta dele junto com filhos, relacionamento e cuidados com
a casa, muitas situações e traumas jogados para baixo do tapete voltaram à
tona. Isso é o que mostra a grande demanda por terapia neste período de
isolamento social devido à epidemia do coronavírus.
A
mestre em psicologia e palestrante curitibana Ana Carolina de Carvalho Pacheco
percebeu um aumento de 90% das consultas desde o início da quarentena. E o que
mais chamou a atenção dela foi o fato das pessoas estarem tendo dificuldade em
se reconhecerem, nesta fase em que a rotina e os comportamentos mudaram.
“Tanto
nos meus pacientes regulares, quanto nos novos, que chegaram devido à
quarentena, percebi as dificuldades de relacionamento primeiro com si mesmo, o
que acaba resultando na dificuldade de se relacionar com o outro. E esse outro
é o parceiro, os pais e os filhos. É um momento muito diferente esse em que nos
encontramos, e o torpor causado pela correria do dia a dia disfarça as
diferenças entre as pessoas e o autoconhecimento. Então, o que tenho observado
é que muitos pacientes, frente essa obrigação de parar, de aquietar, não se
reconhece mais. E isso reflete nas demais relações”, explica a especialista que
conta ter tido casos em que as pessoas declaram literalmente não reconhecerem a
si mesmas frente à nova rotina.
CML,
de 38 anos, que é enfermeira e está trabalhando na luta contra a Covid-19 é um
desses casos.
"Busquei
a terapia nesse momento devido à intensidade dos acontecimentos, as mudanças na
rotina e muitas informações em pouco espaço de tempo. Contando que já tínhamos
problemas do dia a dia para resolver, isso gerou um stress muito grande em mim.
Estava sem saber por onde começar a colocar as coisas em ordem e quais seriam
as prioridades no momento na minha vida e com minha família. Sinto que a
terapia está me ajudando, pois é muito bom quando uma pessoa de fora do nosso
convívio nos dá um direcionamento. Às vezes ficamos paradas em um problema que
não vemos solução e sofremos por isso. Depois das primeiras sessões me sinto
bem mais tranquila e já estou colocando cada coisa em seu lugar".
Na
maioria das vezes, é necessário identificar a fonte do problema, que foi
despertado com a ansiedade causada pelas incertezas da pandemia. Ela explica
que um exemplo é quando os pais chegam reclamando dos filhos, ou vice-versa. Há
antes uma análise a ser feita para entender em quem está a causa do problema.
“Acontece
muito de mãe que traz o filho dizendo que ele deve ter algum problema, e
reclama mil coisas da criança. Na primeira sessão já percebo se é algo da
criança ou se é algo dos pais. Já tive casos que precisaria trabalhar os pais,
mas eles não se comprometiam com o filho verdadeiramente, então eu fiquei com a
criança e fiz o fortalecimento de sua personalidade apesar da situação. Digo
isso para explicar que as pessoas chegam reclamando de algo ligado ao
isolamento e na verdade vamos descobrindo bases diferentes para esse
desconforto”, ilustra a psicóloga Ana Carolina.
Traumas
do passado podem ressurgir neste período
Outra
situação que têm aparecido nas consultas online é de reavivamento de traumas
passados, que estavam dados como resolvidos. Segundo a psicóloga, o isolamento
acaba fazendo você ter convivência principalmente com você mesmo e isso traz
memórias e dores que não foram devidamente curadas.
“Tive
casos de pacientes que o isolamento trouxe à tona situações da infância ou de
muitos anos atrás, que há muito tempo supostamente tinham sido superados. O
fato de ter o tempo livre, faz você conviver com seus pensamentos e memórias, e
se eles não forem saudáveis, acabam transformando o seu momento presente”, diz.
É o
que aconteceu com a paciente SDM, de 41 anos, mãe e profissional da área de
segurança.
“O
isolamento me abalou porque fiquei com medo de não ter meu acompanhamento
psiquiátrico e psicólogo. Fiquei muito assustada e ansiosa até a Dra. Ana me
acolher com as consultas online. Esse momento me trouxe à tona tudo de ruim que
passei no passado. O fato de estar dentro de casa trouxe lembranças de quando
eu era adolescente e não podia sair e, principalmente, memórias da violência
que sofria dentro de casa. Não sei explicar o porquê isso aconteceu. O medo e a
angústia tomam conta de mim e nesse momento choro só de lembrar o que já me
aconteceu, é uma dor da alma. A terapia está me ajudando muito, pois quando
estou nervosa ou em crise ela me acalma e me ajuda a passar por isso neste
período de isolamento", conta.
Todas
as situações levam ao autoconhecimento, fundamento básico do trabalho da
psicologia e que cada vez nos dias de hoje tem sido reforçado em técnicas de
mindfulness, meditação e autoconsciência.
Terapia
em tempos de quarentena: consulta online é para todos?
Com
a quarentena, atendimentos psicológicos, bem como consultas médicas, tiveram
que se adaptar aos novos tempos e estão sendo realizadas com sucesso via
videoconferência. Cada caso deve sempre ser analisado por um profissional e
assim como na medicina, na psicologia há diferentes técnicas de tratamento que
podem funcionar ou não de forma online.
No
caso de Ana Carolina, a técnica utilizada pela profissional é de resolução
rápida de situações e problemas pontuais. A maioria dos que seguem em consultas
periódicas são para trabalhar o autoconhecimento. “O meu foco sempre foi
concentrar no que a pessoa traz para a terapia para assim resolver essa
questão. Nesse momento de isolamento, tenho percebido também uma procura grande
de pessoas querendo sessões únicas, ou seja, um dia de terapia sem
continuidade, para resolver uma questão pontual. Não é comum, mas ela também
pode funcionar nesse momento de grande ansiedade”, explica.
A
profissional, que há cinco anos já pratica terapia online com pacientes que se
mudaram para outros países, destaca que para o método remoto de atendimento
funcionar, há uma necessidade de organização de tempo e espaço para a consulta
via videoconferência. “Alguns pacientes são resistentes, mas agora, diante da
pandemia, acabaram pedindo para fazer online e estão se dando bem. É preciso
que o paciente tenha organização do tempo de consulta para estar tranquilo,
poder se concentrar e não ser interrompido. É sempre um momento que as pessoas
têm para si, essa é uma das bases da terapia”, explica.
Ana
Carolina de Carvalho Pacheco - psicóloga clínica, mestre em psicologia
forense. É palestrante e editora da área de saúde da Juruá Editora.
E-mail: anacarolina@jurua.com.br
Instagram: @carolpsi
E-mail: anacarolina@jurua.com.br
Instagram: @carolpsi
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