O ano de 2019 iniciou-se acalorado no parlamento do
Reino Unido, com as discussões sobre o Brexit. A proposta de saída da União
Europeia, aprovada pelos britânicos no referendo de 2016, vem sendo negociada
desde então. À época, cerca de 52% dos eleitores optaram por deixar o bloco
econômico, e a abstenção foi de quase 30%. Hoje, as complicações dessa decisão
são mais claras do que eram em 2016.
Para entender as adversidades da saída do Reino
Unido, é necessário entender os acordos que unificaram o continente europeu. A
União Europeia é um bloco econômico composto por 28 países, cuja semente está
na década de 1950, quando foi fundada a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço
por seis nações. Com o tempo, a integração aprofundou-se e novos países
entraram no que se tornou Comunidade Econômica Europeia (CEE) em 1957. Logo, a
CEE tornou-se a Comunidade Europeia que, com a assinatura do Tratado de
Maastrich em 1992 torna-se União Europeia.
Os europeus circulam livremente entre os países que
compõem a UE, sem sequer controle de passaportes. Existe também a livre
circulação de mercadorias, serviços e capitais. Mais que isso, o bloco possui
leis e políticas comuns em diversos temas chave ao desenvolvimento, como
comércio, indústria e agricultura, tendo também missões diplomáticas conjuntas
nas Nações Unidas, na Organização Mundial do Comércio, no G8 e no G20. Há
também o Euro, a moeda única, cuja circulação iniciou-se em 2002.
Como se pode perceber, são cerca de 70 anos de
integração que asseguraram uma paz praticamente inédita num continente que já
foi palco de tantos conflitos e guerras. Todo esse aparato unificado dá ao
Brexit diversas dificuldades, a começar pela questão da Irlanda. Enquanto a
Irlanda do Norte é uma província Britânica, a República da Irlanda é um país
independente, que continuará na União Europeia. O ponto de desavenças está
justamente na fronteira entre as regiões República da Irlanda e Irlanda do
Norte.
Uma vez que na União Europeia é livre a circulação
de mercadorias e serviços, com a saída do Reino Unido passa a haver a
necessidade de controle fronteiriço e alfandegário, o que não é da vontade dos
irlandeses. Além disso, existem os compromissos de financiamento dos projetos
da UE, assumidos previamente pelos britânicos. Honrar essas dívidas custará
cerca de 39 bilhões de libras esterlinas – algo como 191 bilhões de reais – aos
cofres da Rainha.
Depois de muitas negociações, que envolveram
dezenas de outros temas, o Reino Unido – capitaneado pela primeira ministra
Theresa May – e a União Europeia chegaram a um projeto de acordo em novembro de
2018, que deveria ter sido votado pelo parlamento britânico ainda no ano
passado. Depois de muitas idas e vindas, esse acordo foi finalmente votado – e
rejeitado – em 15 de janeiro de 2019.
Foram 432 deputados que votaram contra, e apenas
202 foram favoráveis ao que propôs May. Logo na sequência, o líder da oposição
pediu a votação de uma moção de desconfiança em relação a Primeira Ministra.
Como acontece no parlamentarismo, quando um Primeiro Ministro não tem a maioria
dos votos num parlamento, devem haver novas eleições para a escolha de um novo
líder. Dessa vez, no entanto, Theresa May foi vitoriosa, ainda que por uma
pequena margem: 325 votos a favor de sua permanência, e 306 contra.
O que acontece agora? Bem, acontece que May segue
no cargo, e seguirá negociando o Brexit. Há quem defenda um novo referendo,
para que a população opine outra vez. Uma pesquisa feita pelo YouGov em
dezembro mostrou que 64% dos britânicos gostaria de uma nova votação. O
problema é que o prazo para o Brexit se esgota em 27 de março e não há tempo para
um novo referendo. Nesse caso, os representantes dos outros 27 países da União
Europeia precisariam conceder mais prazo ao Reino Unido para seguir com as
negociações ou repensar a saída.
Outra possibilidade é que o Brexit se dê sem
acordo, o que não é ideal, visto que as relações futuras com a União Europeia
permaneceriam nebulosas em diversas áreas, o que prejudicaria a economia de
todos os envolvidos. A terceira via é também problemática, visto que envolve
uma renegociação ampla, que necessitaria da prorrogação do prazo de saída.
Theresa May pode, ainda, tentar antecipar as eleições gerais, concorrendo
novamente. Nesse caso, May precisaria torcer para uma votação ampla em seu
favor.
Seja qual for a opção que May e o Reino Unido
escolham, nenhuma das vias é fácil. A Premiê diz estar disposta a conversar e
negociar com todos os membros e partidos do parlamento, mas uma nova proposta
deverá ser apresentada em até três dias úteis. Como se pode perceber, o tempo
não é um bom aliado nesse momento. Aparentemente, a porta de saída para o Reino
Unido ficou um pouco mais distante.
João Alfredo Lopes Nyegray - advogado, relações
internacionais, especializado em Negócios Internacionais, doutorando em
Estratégia e mestre em Internacionalização. Autor dos livros “Projetos
Internacionais – estratégias de expansão empresarial” e “Legislação Aduaneira,
negócios internacionais e Comércio Exterior”. Professor de Relações
Internacionais, Comércio Exterior, Administração e Economia na Universidade
Positivo.
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