Nos dias 25 e 26 deste mês percorri 600
km de rodovias no Rio Grande do Sul. Cruzei por dezenas de barreiras montadas
pelos caminhoneiros. Nunca tive problema para seguir em frente. Então,
pergunto: a quem estavam destinadas as chicanes pelas quais passei livremente?
Pois é. Aos milhares, elas foram montadas em todas as estradas do país com o
intuito de impedir a passagem dos veículos de carga. Ponto.
Esta simples constatação mostra que o
colossal movimento dos caminhoneiros, que botou o Brasil no acostamento, não
era expressão de uma homogênea e plenipotente vontade, como foi entendido pela
população. Quantos caminhoneiros teriam aderido à greve se lhes fosse dado o
direito de ir e vir? Quantos estacionaram com receio de possíveis represálias
aos veículos, às suas cargas e a si mesmos? Em quase tudo na vida há o que se
vê e o que não se vê. A imensa maioria da sociedade, longe do acostamento, viu
homogeneidade e obstinação da categoria numa situação em que a intimidação de
uns convivia com a prudência de outros. Os caminhões que agora trafegam com combustível
são acompanhados de escolta militar para dar segurança a um transporte que, sem
proteção, não ocorreria ou ocorreria sob inaceitável risco.
As demandas dos caminhoneiros são
compatíveis com uma situação plena de equívocos. A frota cresceu excessivamente;
a prolongada sequência de recessão e lento crescimento da atividade econômica
reduziu a demanda por frete, os custos com diesel subiram demais e o rendimento
de seu trabalho secou. Merecem, hoje e sempre, nosso inteiro respeito esses
bons brasileiros. São empreendedores. Com coragem, sacrifícios e dívidas
adquiriram seu veículo e ganham a vida na insegurança das estradas, trabalhando
árdua e honestamente.
É impossível deixar de ver, no entanto,
os três sequestros que aconteceram nestes dias, alguns dos quais ainda em
curso. Refiro-me ao sequestro inicial das cargas que estavam sendo
transportadas. Refiro-me ao sequestro do direito de ir e vir das pessoas e, com
isso, para milhões de brasileiros, o sequestro da possibilidade de trabalhar,
produzir e se sustentar. Refiro-me ao último sequestrado destes dias, o próprio
movimento dos caminhoneiros, dominado por correntes políticas contraditórias,
interessadas em gerar uma situação de anomia e caos.
Como conservador, creio na mudança, na
reforma, na prudência. Descreio das revoluções, das rupturas, e de que se
encontre no agravamento do caos a saída para o caos.
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é
arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de
jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a
tragédia da utopia; Pombas e
Gaviões; A tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
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