Os geofísicos ensinam que a fusão de rochas com
materiais voláteis, quando submetidas a uma temperatura que pode chegar aos
1500º C, resulta em magma, substância existente no interior da terra em uma
profundidade entre 15 a 1500 kms. Nas últimas semanas, nossos olhos
contemplaram essa massa avermelhada saindo de um vulcão na Guatemala, na
América Central, correndo por encostas, cobrindo cidades de fogo e cinzas, devastando
paisagens e deixando um grande saldo de mortos e desaparecidos.
A imagem da erupção vulcânica nos remete a uma leve
sensação de conforto pelo fato de o Brasil não ter vulcões em atividade, o que
não significa que estamos imunes às desgraças com origem noutros fatores. Nossa
cultura política, por exemplo, é fonte de desvios e curvas que acabam tirando o
país de seu rumo civilizatório. Nem bem saímos da pior recessão da história,
sob acolhedora sombra de reformas que prometiam recolocar o trem nos trilhos e
resgatar a credibilidade do país, eis que o pessimismo volta a abater o ânimo
nacional.
Apesar do alerta do ex-presidente Fernando Henrique
(em seus tempos de mando) de que “não podemos cair no catastrofismo”, o futuro
é nebuloso e tão cheio de interrogações que não há como escapar à ideia de
magmas em formação subindo à superfície do nosso território para explodir na
erupção de um vulcão social, caso se eleja no pleito deste ano um perfil de
extrema direita ou um de extrema esquerda. A sugestão do próprio FHC de se
arrumar consenso em torno de Marina Silva (Rede Sustentabilidade) não resiste à
evidente inferência de que essa figura pacata e moderada não reúne condições
para enfrentar a real politik. Seria tragada por intermitente tufão político.
Voltemos aos extremos. O espírito beligerante de
Jair Bolsonaro, caso o capitão seja eleito, levaria o país para uma posição de
continuados conflitos. Estabeleceria, de imediato, a disputa de
“cabo-de-guerra” entre militantes, multiplicando arengas e querelas, expandindo
posições radicais, e envolvendo classes sociais, levadas a tomar partido diante
de confrontos nas ruas e nas casas congressuais. A ingovernabilidade ganharia
corpo. O clima social ficaria sob a ameaça de um rastilho de pólvora. Que os
bolsonarianos gostariam de jogar aos montes para acender o pavio. O vulcão
entraria em erupção diante de gestos tresloucados do governante.
Do outro lado, eventual perfil representando a
extrema esquerda e correntes de esquerda reforçaria o refrão do apartheid
social, “nós e eles”, que o PT continua a brandir em vídeos, mensagens pelas
redes, expressões de seus porta-vozes – Lula, Gleisi, Lindberg Faria, entre os
principais. Para montar firme na sela do cavalo, o eleito não deixaria brechas:
encheria os tanques da máquina governamental com radicais e enfiaria o Estado
na estrutura partidária. Todos os cantinhos seriam ocupados. Projeto de poder
de 20 anos, com juros e correção monetária cobrados do impeachment de Dilma. Em
suma, teríamos amarração da sociedade ao Estado forte.
O país está dividido. E a hipótese de harmonia
social não passa de lorota quando expressa por figuras das extremidades do arco
ideológico. O que se vê na farta linguagem de militantes nas redes sociais é a
destilação de ódio, infâmias, acusações pesadas, falsidades e enaltecimento às
ditaduras. O Brasil volta a sofrer a síndrome de Sísifo, o condenado pelos
deuses a depositar a pedra no cume da montanha, tarefa que tenta executar por
toda a eternidade.
Gaudêncio Torquato -
jornalista, é professor titular da USP, consultor político e de comunicação Twitter@gaudtorquato
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