Muitos profissionais da psicologia afirmam que é
comum observarmos, entre jovens e adolescentes, o comportamento transgressor.
Não seguir completamente as regras estabelecidas socialmente e questionar a
autoridade imposta é tido como um ponto presente no desenvolvimento e na
formação da personalidade. Estudo recente, publicado no periódico Psychological
and Personality Science, confirma essa tese ao constatar que o
indivíduo, no ato de desrespeitar regras estabelecidas, se sente empoderado e
aqueles que com ele convivem também enxergam, nessa ação, uma demonstração de
poder. Se levarmos em conta o quanto é importante para um adolescente ser
aceito pelo grupo, ser visto como alguém com poder é muito atrativo. Por tudo
isso, podemos considerar o ato de “colar” em avaliações algo bastante comum,
desde que seja pontual, ocasional. A situação muda de figura quando o
fenômeno da “cola” se torna quase que endêmico, conforme sugere pesquisa
realizada nos Estados Unidos: 51% dos alunos de escolas de elite praticam o ato
de “colar” em avaliações, por conta das facilidades que novas tecnologias
promovem e motivados pela alta concorrência a ser enfrentada.
Quando o ato de “colar” ganha proporções que afetam
e comprometem todo sistema avaliativo de uma instituição de ensino, penso
termos diante de nós um problema atingindo pelo menos três aspectos da prática
educativa: pedagógico, teleológico e axiológico. No que se refere ao aspecto
pedagógico, identifico duas situações como problemas a serem enfrentados:
a estrutura da avaliação e a significação da aprendizagem. As avaliações
que cobram do aluno apenas sua capacidade de memorização em detrimento de sua
capacidade global de raciocínio, são avaliações que permitem a identificação da
“cola” como possibilidade de sucesso; já uma avaliação construída de modo
inteligente, em que a memorização não seja o único elemento presente,
desestimula o ato de “colar”. Outro elemento pedagógico a ser considerado é o
fato de que o aluno praticante da “cola” não observe naquele conteúdo algo
significativo para ele - algo que, na tomada de sua posse, o fará alguém
melhor, trará capacidades, auxiliará no seu desenvolvimento e aperfeiçoamento. Esse
aluno pode ceder mais facilmente à tentação de substituir a aquisição do
conhecimento por uma “aparência de aquisição”.
Pensando no aspecto teleológico (causa final,
perspectiva futura), o aluno, ao tentar fraudar em uma avaliação, não possui a
devida consciência de que precisará dominar aquele conteúdo em um exame
vestibular, em um concurso público ou em qualquer tipo de processo seletivo
futuro. Trata-se de uma percepção prática que lhe falta. A fraude resolve o
problema por agora e cria um problema maior no futuro. Finalmente, mas não
menos importante, temos a dimensão axiológica (valores, ética, moral). Ao
praticar a “cola” em uma avaliação, o educando pode não ter a consciência de
que está cometendo um ato infracional e também antiético. A ética, nesse caso,
é tomada não como parte inerente ao corpo da reflexão filosófica e sim em seu
sentido mais amplo de busca pela ação correta, pela ação coberta por valores
que a dignificam. A situação pode ser ainda pior se o educando possui a
consciência de estar cometendo um ato antiético (em que é prejudicado alguém
que se esforçou e agiu corretamente) e não se importar com isso; nesse caso, o
programa de formação humana e ética do educando apresenta grande falha, pois o
estudante não está valorizando o aspecto da justiça e o valor inerente ao
espírito de sacrifício e dedicação.
Dentro do contexto de combate ao fenômeno da “cola”
em avaliações, uma instituição de ensino deve promover um bom programa de
formação humana e ética; desenvolver no educando a consciência e a valorização
da ação correta; despertar o aluno para o valor do conhecimento e sua relação
com o desenvolvimento humano; criar avaliações capazes de desafiar a
inteligência do estudante e não apenas seu poder de memorização; fazer com que
todos os envolvidos no processo pedagógico entendam o imenso valor de se viver
a justiça e se combater a corrupção. Desse modo, o fenômeno da “cola” não será
endêmico, mas apenas pontual.
Carlos Roberto Merlin Júnior - graduado em Filosofia, Sociologia e
História e especialista em Ética. É gestor educacional do Colégio Positivo -
Ângelo Sampaio.
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