quarta-feira, 25 de abril de 2018

Escrituras de uniões poliafetivas em debate no CNJ


Para especialista em direito de família, documento é ilegal 


As escrituras de uniões poliafetivas, entre três, quatro, cinco ou mais pessoas, por Tabelionatos de Notas está na pauta do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A ADFAS (Associação de Direito de Família e das Sucessões) pediu providências ao CNJ para que seja vedada a lavratura em Tabelionatos de Notas dessas escrituras.

Em medida liminar a Ministra Nancy Andrighi, enquanto exerceu o cargo de Corregedora Nacional de Justiça, proferiu decisão liminar de recomendação a todos os Tabelionatos de Notas para que não lavassem essas escrituras até o julgamento do pedido de providências que foi feito pela ADFAS - Associação de Direito de Família e das Sucessões.

A primeira sessão de julgamento ocorreu nesta terça-feira (24), quando o Relator e Corregedor Nacional de Justiça, Ministro João Otávio de Noronha, proferiu voto pela procedência do pedido de providências da ADFAS, com fundamentos muito relevantes, entre os quais o de que um Tabelião de Notas não pode contrariar a lei, atribuindo direitos a pessoas que não são reconhecidos pelo ordenamento legal.

Especialista em direito de família e presidente da ADFAS, a advogada Regina Beatriz Tavares da Silva, que elaborou o pedido de providências ao CNJ e realizou sustentação oral na sessão de julgamento, reforça que escritura de união poliafetiva como entidade familiar, ou forma de família, é ilegal, porque a união estável segundo a Constituição Federal é constituída por duas pessoas, um homem e uma mulher, sendo que o Supremo Tribunal Federal (STF) quando atribuiu às uniões homoafetivas a natureza de entidade familiar também sempre faz referência a duas pessoas. 

Regina Beatriz afirma que "as uniões estáveis, que se equiparam ao casamento, são sempre monogâmicas para terem efeitos de direito de família ", sejam heterossexuais, sejam homoafetivas.

"Escrituras públicas de 'trisais' como entidades familiares são ilegais porque violam o comando constitucional da monogamia nas uniões estáveis, além de não ser moral, ética e socialmente aceitáveis", salienta. 

A advogada alerta, ainda, que, por atribuir a esse tipo de relação de união estável, efeitos de direito de família e também efeitos perante terceiros, tais escrituras poderão onerar os gastos públicos como a previdência social, assim como pretendem obrigar empresas privadas, como planos de saúde, a aceitar todos os participantes dessas relações como dependentes ou beneficiários.

"E o que é pior, os filhos que uma das mulheres envolvidas tiver, se esse tipo de relação fosse considerado união estável, seriam filhos do "trisal", ou de todas as pessoas que figuram nas escrituras. Pode-se imaginar a grave ofensa à dignidade dessa criança, que crescerá com o estigma de ter três, quatro, cinco ou mais pais e mães", afirma.

Além disso, Dra. Regina Beatriz chama a atenção ainda para o prejuízo que tal relação poderá trazer para a luta travada pelas mulheres pela conquista de direitos iguais.

Segundo ela, as mulheres brasileiras lutaram e lutam pela igualdade de direitos há muitos anos, até que conseguiram a equiparação, sendo marido e mulher iguais no casamento segundo a lei. Sempre que há duas ou mais mulheres numa relação poligâmica, a desigualdade tende a se instalar. Note-se que numa dessas escrituras de trisais o homem é o único chefe da relação. Vamos retroceder na luta das mulheres por igualdade?

"Apesar dos recentes debates sobre o conceito de família, o que abriu espaço para a aplicação do conceito de união estável a relacionamentos homoafetivos, o mesmo não se aplica a uma relação poligâmica. Nossa sociedade não aceita a poligamia e não existe suporte em nosso ordenamento jurídico para a atribuição de efeitos de direito de família a esse tipo de relação", conclui.

O julgamento terá continuidade numa próxima sessão do CNJ.


Histórico

Permitidas em 2016, a lavratura em cartórios comprovando uniões estáveis para casais poliafetivos foi proibida após a aceitação, em caráter liminar, de requerimento feito à Corregedoria Nacional de Justiça. 

A decisão, proferida pela ministra Nancy Andrighi, recomendou a todos os tabelionatos de notas que não lavrassem esse tipo de escrituras até o que processo fosse julgado.

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