Muriqui-do-norte está entre as espécies mais
ameaçadas
Créditos: Central Press
Créditos: Central Press
Existem cerca de 500 espécies de primatas no
planeta Terra e 60% delas correm risco de extinção. No Brasil, país com o maior
número de espécies conhecidas, 35 das 139 são consideradas ameaçadas, de acordo
com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). No
entanto, as principais ameaças aos macacos também são grandes riscos para a
humanidade, e a maior parte é gerada justamente pelo homem.
Um exemplo é o novo ciclo de febre amarela que
preocupa o Estado de São Paulo. A morte de aproximadamente 300 macacos até o
início de novembro provocou o fechamento de parques como o Horto Florestal e o
Parque Ecológico do Tietê, entre outros. De acordo com o especialista em
primatas e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN),
Sérgio Lucena Mendes, o desenvolvimento da doença se torna mais propício pela
redução das áreas silvestres e consequente avanço das cidades. Quando
adicionamos outros fatores, como mudança climática, por exemplo, a equação se
torna ainda mais complicada. “É preciso ver o surto com um olhar ecológico,
além da preocupação com a saúde humana. Para controlar a febre amarela é
preciso, necessariamente, preservar os habitats naturais e suas espécies
nativas. Desflorestar e matar macacos não impede a circulação do vírus da
doença e pode até piorar a situação”, analisa.
O especialista explica a relação entre a
sobrevivência de humanos, dos primatas e o desmatamento. “Enquanto os macacos
precisam da floresta para sobreviver e são afetados diretamente pelo
desmatamento, nós humanos gostamos de acreditar que não sentimos os impactos
tão rapidamente e invadimos o habitat deles para plantar ou para realizar
obras. O que não percebemos é que os serviços ambientais prestados pelas
florestas são essenciais para nós. Qualidade do ar, abastecimento e qualidade
da água, manutenção da temperatura e do clima, entre outros, são vitais para a
humanidade”, analisa Mendes.
Um estudo publicado em janeiro, na Revista Science
Advances divulgou que além das espécies ameaçadas, outras também devem
desaparecer nos próximos 25 anos, a não ser que a conservação se torne uma
prioridade. A expansão da humanidade pode ser citada como a principal causa
para a redução que está sendo observada. A perda de habitat, causada pelo
desmatamento, é uma das razões mais impactantes, explica o biólogo Fabiano
Melo, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN). “A
redução de habitat é a principal causa de ameaça aos primatas há décadas, com a
caça sendo um impacto decisivo nesses ambientes fragmentados”. O desmatamento
que acontece em todo o País é consequência de grandes obras de infraestrutura,
da ampliação do agronegócio e do crescimento humano desordenado, entre outras
questões”, alerta.
Planeta dos macacos em risco
A redução da população de primatas no Brasil e no
mundo é um alerta importante por diversos aspectos. Além do desmatamento, uma
ameaça mais visível, há também outros fatores relevantes, como o grau de
conservação das florestas e questões de saúde tanto dos animais como da comunidade.
A bióloga Cecília Kierulff explica que a
diversidade de animais também é importante para a manutenção da qualidade de
vida das pessoas. “Além da preocupação com o desmatamento, também temos que
garantir a presença de diferentes animais nessas áreas. Não basta ter uma
floresta vazia, é preciso ter toda uma rede de animais que exercem diferentes
funções na natureza, desde insetos polinizadores até animais como onças e
gaviões que estão no topo da cadeia”, conta ela, que também faz parte da RECN.
A febre amarela é outro exemplo de como a
degradação das florestas pode prejudicar o bem-estar da comunidade e colocar em
risco as populações de primatas. No início do ano, milhares de mortes, tanto de
humanos e muito mais de primatas, aconteceram devido à contaminação provocada
por mosquitos dos gêneros Sabethes e Haemagogus, que
vivem especificamente em ambientes florestais. A proximidade cada vez maior das
áreas urbanas às florestas facilita a disseminação da doença, que é letal para
os primatas e dizimou espécies nas regiões Sudeste, Nordeste e Norte. “A saúde
humana está intimamente relacionada à saúde do meio ambiente. O controle da
febre amarela inclui, necessariamente, a preservação dos habitats naturais e
suas espécies nativas”, alerta Sérgio Lucena Mendes, que também ressalta: “com
a volta das temperaturas altas, a doença pode voltar a ter as mesmas
consequências que vimos no início do ano. Alguns casos de morte de macacos em
São Paulo já nos apontam nessa direção”. Com a falta de vacinação, uma tragédia
muito maior pode ocorrer, uma vez que o mosquito transmissor da dengue, da
chikungunya e da zika, conhecido como Aedes aegypti, também pode ser o vetor
da febre amarela nas áreas urbanas, potencializando os riscos. Felizmente, isso
não ocorre no Brasil desde 1942.
Conservação da saúde e do meio ambiente
Como a conservação dos primatas e a preservação do
habitat onde vivem são fatores intimamente ligados, pesquisadores de diferentes
áreas do Brasil atuam em projetos que atuam em ambas as frentes.
A bióloga Cecília Kierulff, por exemplo, comemora a
ampliação da Reserva Biológica União, criada em 1998 na região de Rio das
Ostras, no estado do Rio de Janeiro. O mico-leão-dourado (Leontopithecus
rosalia) estava extinto no local, mas, em 1994 Cecília remanejou 42
micos-leões-dourados para a área por meio de um projeto apoiado pela Fundação
Grupo Boticário de Proteção à Natureza. Hoje há mais de 300 micos-leões na
Reserva. Além do benefício para o meio ambiente, que ganhou mais uma área de
proteção ambiental, que beneficia todas as espécies que ali existem, os micos
puderam passar de “Criticamente em Perigo”, de acordo com a classificação da
Lista Nacional de Espécies Ameaçadas de Extinção, a chamada Lista Vermelha,
para “Em Perigo”. Apesar de continuar ameaçado, a situação de conservação do
mico-leão-dourado melhorou.
Na região Sudeste, o muriqui-do-norte (Brachyteles
hypoxanthus), uma das espécies de primatas mais ameaçadas do mundo,
está sendo beneficiado por dois projetos apoiados pela Fundação Grupo Boticário
de Proteção à Natureza. Um no Espírito Santo, que prevê a elaboração de um
plano de manejo e maior conhecimento da população de muriquis na região serrana
do estado, além de ações de conscientização e engajamento da comunidade. Em
Minas Gerais, a conservação do muriqui-do-norte ganhou apoio tecnológico
inédito, com o desenvolvimento de um drone com câmera ultra HD e termal para
monitoramento da espécie.
O mesmo acontece com o muriqui-do-sul (Brachyteles
arachnoides). Uma pequena população da espécie, que era considerado
extinto no Paraná há décadas, foi encontrada em fragmentos florestais, em 2002,
em uma região com baixa densidade populacional. Esse fato ressaltou a
importância da conservação dessas áreas em que a espécie ainda sobrevive.
Carlos Hugo Rocha, engenheiro agrônomo, professor da UEPG e membro da Rede de
Especialistas em Conservação da Natureza, conduz o projeto para caracterização
socioeconômica da região, no Vale do Ribeira, no Paraná. O objetivo é apoiar
estudos para a criação de uma área protegida associada à definição de políticas
públicas para a conservação do muriqui-do-sul, que é considerado “em Perigo”,
pelo ICMBio.
Sobre a Rede de Especialistas de Conservação da
Natureza
Rede de Especialistas de Conservação da Natureza é
uma reunião de profissionais, de referência nacional e internacional, que atuam
em áreas relacionadas à proteção da biodiversidade e assuntos correlatos, com o
objetivo de estimular a divulgação de posicionamentos em defesa da conservação
da natureza brasileira. A Rede foi constituída em 2014, por iniciativa da
Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.
Sobre a Fundação Grupo Boticário
A Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza é uma organização sem
fins lucrativos cuja missão é promover e realizar ações de conservação da
natureza. Criada em 1990 por iniciativa do fundador de O Boticário, Miguel
Krigsner, a atuação da Fundação Grupo Boticário é nacional e suas ações incluem
proteção de áreas naturais, apoio a projetos de outras instituições e
disseminação de conhecimento. Desde a sua criação, a Fundação Grupo Boticário
já apoiou 1.528 projetos de 501 instituições em todo o Brasil. A instituição
mantém duas reservas naturais, a Reserva Natural Salto Morato, na Mata
Atlântica; e a Reserva Natural Serra do Tombador, no Cerrado, os dois biomas
mais ameaçados do país. Outra iniciativa é um projeto pioneiro de
pagamento por serviços ambientais em regiões de manancial, o Oásis. Na
internet: www.fundacaogrupoboticario.org.br,
www.twitter.com/fund_boticario
e www.facebook.com/fundacaogrupoboticario
Nenhum comentário:
Postar um comentário