Trabalho
feito em parceria entre INTERFARMA e QuintilesIMS revela mortalidade elevada e
defasagem em todas as fases das políticas públicas contra o câncer, do
diagnóstico ao tratamento
Os
investimentos feitos pelo Brasil e as estratégias adotadas na luta contra o
câncer são insuficientes para vencer a doença. Isso é o que revela um relatório
elaborado em parceria entre INTERFARMA (Associação da Indústria Farmacêutica de
Pesquisa) e QuintilesIMS, uma das principais consultorias do mundo em saúde, e
lançado hoje (26/09) na abertura do evento Todos Juntos Contra o Câncer (TJCC),
em São Paulo.
O
documento acaba de ser lançado e traz o seu objetivo explícito no título:
“Alternativas para ampliação do acesso à saúde no Brasil - Um estudo em
Oncologia”. Em suma, o documento traz comparações internacionais e apresenta
estratégias nas áreas de prevenção, diagnóstico e tratamento que podem gerar
melhores resultados na contenção do câncer.
“O
que torna o combate ao câncer tão desafiador é a complexidade da doença. Não
existe um câncer e sim dezenas deles, que requerem dezenas de tratamentos e de
modelos de prevenção. O SUS foi bem-sucedido contra doenças infecciosas e
conseguiu aumentar a expectativa de vida da população. Agora, vivemos outra
realidade, que pode implicar em ajustes nos atuais modelos de financiamento”,
afirma Antônio Britto, presidente-executivo da INTERFARMA.
Gastos
crescentes
Mundo
afora, os gastos com saúde aumentaram 195% entre 1995 e 2014, alcançando US$
7,6 trilhões, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Esse salto
se deve, em parte, ao envelhecimento da população e ao crescimento dos gastos
com câncer.
No
Brasil, embora tenha havido um incremento de 119% nos gastos com saúde, esse
aumento é inferior à média mundial. Especificamente com câncer, o gasto do
Sistema Único de Saúde (SUS) cresceu 9% ao ano entre 2010 e 2014, alcançando
quase R$ 2,5 bilhões em 2014, sendo cerca de 80% do valor com quimioterapia e
radioterapia.
Incidência
e mortalidade
No
Brasil, a incidência do câncer aumentou 12% em seis anos, entre 2010 e 2016,
alcançando 420 mil novos casos por ano, segundo dados do INCA (Instituto
Nacional do Câncer). A mortalidade já alcança 42%, índice superior a três dos
quatro países tidos como referência no combate à doença, porém inferior aos
cinco países considerados diretamente comparáveis ao Brasil.
A
tabela acima também mostra a mortalidade de alguns dos principais tipos de
tumores existentes. Destes, o Brasil tem mortalidade muito superior em três dos
quatro casos: próstata, colorretal e traqueia, brônquios e pulmões.
Prevenção,
diagnóstico e tratamento
Para
um combate eficiente ao câncer, é preciso ter políticas públicas de saúde
eficientes em três frentes de ação: prevenção, diagnóstico e tratamento, sendo
que essa última pode ser observada também sob a perspectiva do acesso às novas
tecnologias.
Prevenção
- No
que diz respeito à prevenção, o Brasil felizmente reúne importantes conquistas
contra alguns tipos de tumores. As campanhas e demais ações antitabagismo,
principal fator de risco para câncer de pulmões, assim como o trabalho contra
câncer de colo de útero e câncer de fígado, feito principalmente com vacinação,
são exemplos de sucesso no País.
Contudo,
o País ainda se destaca negativamente pela alta prevalência de alguns dos
principais fatores de risco do câncer: consumo de álcool, sedentarismo e
obesidade. Veja a comparação internacional, com dados da OMS, a seguir:
Diagnóstico
- O
diagnóstico, por sua vez, é feito tardiamente. Dados do Tribunal de Contas da
União (TCU), em seu Relatório de Auditoria Operacional, mostram que 60% dos
pacientes foram diagnosticados em estágio avançado da doença, níveis III e IV.
Quanto mais avançado o estágio, mais difícil é o tratamento e, dependendo do
caso, menores são as chances de cura da doença. Veja a tabela a seguir, sobre o
estadiamento da doença no momento do diagnóstico:
Fonte: TCU.
Tratamento
- O
governo Federal preconiza haver uma unidade especializada em oncologia para
cada mil novos casos no País. Portanto, com 420 mil novos casos, deveriam estar
disponíveis à população 420 Unidades de Assistência de Alta Complexidade
(Unacons) e Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Cacons),
mas existem apenas 315. Isso gera um déficit de 105 unidades, o equivalente a
25% do que deveria estar disponível.
Segundo
dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA), o déficit seria de 44 unidades de
atendimento de cirurgia, 39 de quimioterapia e 135 de radioterapia. Se
considerado os estabelecimentos privados que não prestam serviço ao SUS, o
déficit em radioterapia se reduziria para 57 equipamentos.
Propostas
Das
propostas elaboradas pelo estudo, a primeira seria relativa à prevenção.
Deve-se realizar um levantamento sistemático de dados acerca das doenças para,
com isso, planejar melhor as próximas ações de prevenção, buscando sempre
maximizar o impacto e atender às situações mais urgentes e carentes de
prevenção ao câncer.
O
levantamento de dados não seria apenas com relação aos fatores de risco, mas
também ao estadiamento da doença no momento do diagnóstico. Isso permitiria
aperfeiçoar as estratégias para diagnóstico precoce de tumores, assim
favorecendo o sucesso de possíveis tratamentos.
Essa
coleta de dados joga luz sobre outro fator importante: o uso de “dados do mundo
real”, em vez de apenas dados de pesquisa. A coleta de informações, nesse caso,
é fundamental para verificar eficácia, segurança e impacto social dos exames e
tratamentos prescritos. Assim, poder público e iniciativa privada podem
elaborar melhores estratégias sobre quais tecnologias e protocolos incorporar
e/ priorizar.
Por
fim, o estudo sugere a revisão dos modelos de remuneração. Os problemas
apontaram para deficiências tanto no SUS, principalmente os pagamentos por
procedimentos (APAC), quanto no sistema suplementar, com as contas abertas.
Entre as críticas a tais modelos, como são adotados, está a de que hoje se
financia o volume de serviços e não a qualidade e eficiência dos cuidados. Os
hospitais e profissionais são remunerados pela quantidade e valor dos
procedimentos realizados, sem mecanismos claros que busquem promover a
eficiência dos gastos e tampouco o cuidado de longo prazo com os pacientes.
A
realidade do tratamento do câncer hoje exige um mecanismo mais complexo e
abrangente, que considere todas as variantes em cada tipo de câncer e nichos de
pacientes. Por fim, sem um acompanhamento mais próximo com relação aos
desfechos dos tratamentos autorizados e a variabilidade dos protocolos
adotados, abre-se espaço para a utilização de tratamentos com valores abaixo do
reembolso para gerenciar os resultados financeiros, com potencial prejuízo aos
pacientes.
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