Passado o episódio da votação
de admissibilidade da denúncia contra o presidente Michel Temer por corrupção,
cabe uma análise criteriosa sem influência do calor dos fatos relativos à
sessão na Câmara Federal. Perdura o questionamento: por que o presidente saiu
ganhador no embate legislativo, quando evidências e provas eram-lhe
desfavoráveis? A resposta tem muitas variantes e argumentos. Sabidamente,
aconteceu o que é costumeiro acontecer, houve a manobra política do governo com
distribuição de benesses, inclusive liberação de emendas orçamentárias, na
‘undécima hora’, a parlamentares negocistas.
Todos os argumentos tentando
justificar o resultado do episódio são aceitáveis, todavia no meu entendimento
o elemento decisivo foi o desinteresse da sociedade que mesmo com algum grau de
indignação diante dos fatos permaneceu alheia ao ponto central da questão.
Acredito que se houvesse mobilização e vigorosa tomada de posição o desfecho
seria outro. É bom recordar casos anteriores na nossa história política. Quando
o então presidente Fernando Collor enfrentou processo de cassação e mais
recentemente no impeachment de Dilma Rousseff o povo foi para as ruas,
mobilizou a opinião pública e exerceu legítima pressão. No caso atual a
denúncia e as provas apresentadas mostravam ser a situação de Michel Temer tão
ou mais grave do que nos exemplos citados.
Temer estava mais complicado
(e ainda não se encontra totalmente a salvo, há expectativa de que nova
denúncia poderá ser apresentada), havia entendimento generalizado de que teria
de ser punido, tanto que o governo mobilizou todas as forças disponíveis para neutralizar
o processo, o que resolveu, o presidente acabou poupado, mas ficou o sentimento
de frustração.
A pergunta é “por que o povo
não saiu às ruas”? A conclusão pode ser preocupante: estará o povo desiludido,
descrente de mudanças que possam recuperar a decência política?
Claro está que o desfecho da
votação foi favorecido pelo próprio processo político, pois a oposição (leia-se
PT e seus aliados) não foi enfática, preferindo prolongar o desgaste do
presidente, certamente antevendo o pleito de 2018. Exponenciais lideranças
empresariais igualmente se mantiveram distantes, assim como setores que
concentram notórios formadores de opinião.
O fator decisivo em favor de
Temer foi a ausência do povo nas ruas. A pressão popular funciona mesmo, tem
força, pois os políticos, especialmente deputados, no caso, tomam cuidado em
não contrariar a vontade popular. Muito provavelmente, se os brasileiros fossem
às ruas a maioria dos deputados teria votado diferente. A apatia popular
sinaliza para algo preocupante porque a descrença ou acomodação não ajudará em
nada nas mudanças, principalmente éticas, que o país carece.
Politicamente as coisas se
aquietaram e o governo está tentando implementar as reformas estruturais,
portanto tem seus méritos. Porém, uma administração adequada não isenta nenhum
governante de sofrer sanções quando cometer erros, notadamente se estiverem
ligados a crimes como corrupção. No caso em foco, por justiça Michel Temer
deveria ser condenado, julgamento que leva em consideração a boa gestão em detrimento
da lisura e da decência é completamente errado. Acredito que se o povo houvesse
se conscientizado disso teria se manifestado com vigor. Se a voz da sociedade
se calar podem acontecer coisas piores.
Para evitar que isso aconteça
o povo tem de ter pleno convencimento do peso de sua participação e da força de
sua pressão. Grandes mudanças e importantes correções de rumos aconteceram a
partir do engajamento popular, afinal, uma das definições da democracia é
‘governo do povo, pelo povo e para o povo’.
Luiz Carlos Borges da Silveira - empresário, médico e professor. Foi
Ministro da Saúde e Deputado Federal.
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