Agora que o governo e o
Congresso estão mexendo em alguns pontos importantes da legislação seria
conveniente e oportuno que destravassem (ou desengavetassem) propostas que
visam à regulamentação de greve no serviço público. Esse dispositivo da
Constituição de 1988 ainda não foi regulamentado, fato que causa transtornos
para a população devido ao excesso de paralisações em setores essenciais.
Um estudioso do assunto já disse que “parece evidente que qualquer trabalhador deva ter o direito de
reivindicação assegurado pela sociedade e que, no impasse da negociação, também
deva a ele ser garantido o exercício do direito de greve”. No caso do servidor
público esse exercício de paralisação, como última forma de pressão, por vezes
esbarra no interesse coletivo social, no direito de terceiro, porque não dizer
no senso da coletividade que enxerga naquela função uma atividade essencial à
sociedade.
O número exacerbado de movimentos de greve de
servidores – federais, estaduais e municipais – nesse momento de crise que o
Brasil atravessa, merece reflexão mais atenta na busca pela solução desse tipo
de conflito coletivo. Afinal, porque as escolas, o Judiciário, os hospitais,
autarquias federais, o INSS, o serviço de correio e, por vezes, a polícia,
param em protesto por causas diversas.
Ultimamente o STF tem se pronunciado para resolver
controvérsias e solucionar impasses pontuais, mas o correto e que houvesse
regulamentação legal sobre o tema. A última intervenção do Supremo foi para
declarar que o poder público deve descontar os dias parados por greve,
ressalvando que o desconto não poderá ser feito caso o movimento grevista tenha sido
motivado por conduta ilícita de o próprio Poder Público, e também deixou em
aberto a possibilidade de acordo de reposição dos dias parados.
No
julgamento no STF o ministro Gilmar Mendes citou as greves praticamente anuais
nas universidades públicas que duram meses a fio sem que haja desconto. “É
razoável a greve subsidiada? Alguém é capaz de dizer que isso é licito? Há
greves no mundo todo e envolvem a suspensão do contrato de trabalho de
imediato, tanto é que são constituídos fundos de greve”, registrou o ministro
em seu voto.
Para ter uma ideia mais clara, não faz muito
tempo os motoristas e cobradores de ônibus de Curitiba (que prestam serviço
público, embora pertencentes à iniciativa privada) fizeram indicativo de greve
‘por suposição’. Entenderam que as empresas não iriam pagar na data prevista o
adiantamento salarial, chamado de vale, e o sindicato decretou greve, o que
seria normal se houvesse um direito dos trabalhadores ferido, o que não era o
caso, era mera presunção.
No serviço público isso é também comum. Basta
recordar o caso dos professores estaduais do Paraná. Anualmente fazem
paralisação para “celebrar” um evento ocorrido há mais de dez anos, quando o
governo usou a cavalaria para dispersar os piquetes que ameaçavam invadir o
Palácio Iguaçu. Qual o motivo dessa greve anual? Nenhum. A lembrança do
acontecido poderia – e pode – ser marcado com manifestação, não com greve.
Na maioria dos movimentos grevistas os
sindicatos apresentam ampla pauta para no final negociar o mínimo (isso acontece
também no âmbito particular), no final defendem apenas o não desconto dos dias
parados. Foi isso que o STF determinou, decidindo que os dias de greve devem
ser descontados dos salários dos grevistas. A greve no serviço público está
banalizada e gera graves problemas aos cidadãos.
Não se trata de negar ou restringir o direito
de greve dos servidores públicos, constitucionalmente assegurado, mas sim a
normatização para que não mais haja distorções, abusos ou banalização. Penso
que o Congresso deve tratar seriamente dessa questão, sem preocupação em
agradar ou desagradar setores corporativos. Afinal, o direito do cidadão
brasileiro está acima de tudo – direito esse que vem sendo seguidamente
desrespeitado.
Luiz Carlos Borges da Silveira -
empresário, médico e professor. Foi Ministro da Saúde e Deputado Federal.
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