Confira
o que pode ser feito para reduzir a exposição a produtos químicos e tóxicos
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O Brasil é um dos maiores usuários de
agrotóxicos do mundo, o que pode ser justificado pela sua característica de ser
também um dos maiores produtores e exportadores de alimentos do planeta. Há os
que o defendem dizendo que são imprescindíveis, e os que o defenestram afirmando
que são prejudiciais à saúde. A verdade é que, por aqui,
muitos químicos banidos no exterior continuam a ser usados.
Cientistas de todos os lugares vêm
relatando tendências preocupantes sobre o efeito desses produtos na saúde em
geral e, em especial, sobre o aspecto reprodutivo da população em todo o mundo. Pesquisas mostram que os pesticidas são, pelo menos
em parte, culpados por muitas alterações físicas. Estudos apontam para uma
crescente evidência científica ligando produtos químicos a muitos danos à saúde
reprodutiva, como a redução na contagem e qualidade de espermatozoides,
puberdade precoce em meninas, defeitos congênitos, aborto espontâneo e
natimortos, entre outros.
“Há poucos anos, o site National Survey of Family Growth
fez um levantamento sobre casais com dificuldade em engravidar e,
surpreendentemente, observou um aumento maior desse problema em pessoas com
menos de 25 anos (42%). Isso, segundo a publicação, sugere que as alterações
ambientais nos últimos anos prejudicaram mais os casais jovens, por terem sido
expostos a substâncias tóxicas presentes no meio ambiente num período de vida
mais precoce”, afirma Arnaldo Cambiaghi, especialista em Medicina Reprodutiva e
diretor do Centro de Reprodução Humana do IPGO.
Hormônios
interrompidos
Um grupo de produtos químicos -
disruptores endócrinos - são particularmente propensos a interferir na saúde
reprodutiva, mesmo quando os níveis de exposição são extremamente baixos.
Alguns desses produtos químicos imitam os hormônios humanos ou interferem de
alguma forma nos sistemas controlados por hormônios que podem bloquear (ou
sobrecarregar) uma série de processos biológicos.
Ao longo da vida, os produtos químicos
desreguladores endócrinos podem danificar o sistema reprodutivo de várias
maneiras. Alguns matam ou danificam células; se forem espermatozoides ou
oócitos, o resultado pode ser a infertilidade. Outros alteram a estrutura do
DNA, causando mutações genéticas que podem resultar em defeitos congênitos ou
incapacidade de conceber.
Alguns produtos químicos podem até
causar efeitos "epigenéticos", ou seja, eles mudam a forma como os
genes são expressos - não apenas para os expostos, mas também para as gerações
futuras. Um bebê no útero é particularmente vulnerável a substâncias químicas
desreguladoras do sistema endócrino, pois os hormônios estão ocupados regulando
a diferenciação das células e o desenvolvimento dos órgãos.
Bebês expostos ao produto químico
errado, justamente quando os órgãos reprodutivos estão se formando, podem
sofrer danos que vão se desenrolar ao longo da vida. Cientistas da Sociedade Nacional
de Endocrinologia norte-americana explicam por que o momento da exposição é tão
importante: nos
casos em que a ruptura é direcionada para a programação de uma função, por
exemplo, saúde reprodutiva, isto pode interferir com a organização inicial da
vida, seguida por um período latente, após o qual a função é ativada e a
disfunção pode tornar-se óbvia.
Em outras palavras, a exposição a
substâncias químicas, quando o sistema reprodutivo de um bebê está se
desenvolvendo, pode descarrilar completamente o processo. Mas só se saberá ao certo o que ocorreu anos depois, quando surgem
problemas durante a puberdade ou quando se tenta engravidar.
Pesticidas: um dos principais culpados
Os cientistas entendem que a exposição
a pesticidas pode causar uma ampla gama de danos reprodutivos que afetam
homens, mulheres e crianças. Alguns estudos sugerem
que:
=No primeiro estudo desse tipo,
cientistas de Harvard descobriram que os homens que comiam alimentos com mais
resíduos de pesticidas tinham menor contagem de espermatozoides que também eram menos normais que os de outros homens.
=A exposição ao herbicida atrazina tem
sido associada a distúrbios menstruais, bebês com baixo peso ao nascer e
defeitos congênitos.
=Um estudo de 2013 ligou pesticidas
liberados, incluindo o lindano organoclorado, ao aumento do risco de
endometriose em mulheres.
Os pesticidas também foram implicados
em aborto espontâneo, parto prematuro, fertilidade reduzida em homens e
mulheres e na proporção sexual alterada (menos meninos nascendo).
Estudo feito em 2018 nos Estados Unidos e publicado no National Center for Biotechnology Information – “Produtos Químicos Antiandrogênicos Mistos em Baixas Doses Individuais Produz Malformações do Trato Reprodutivo no Rato Masculino”- confirma que a situação vem piorando:
“Os esforços de biomonitoramento mostraram claramente que
todos os seres humanos estão expostos a misturas químicas. É preocupante se a
exposição a misturas durante a gravidez contribui ou não para anomalias
congênitas em crianças, mesmo quando uma dose individual de cada produto
químico não afetaria o feto. Pensando hipoteticamente que a exposição in utero a uma mistura de
substâncias químicas cobrindo múltiplos mecanismos de ação ‘antiandrogênica’
em doses que, individualmente não têm efeito
adverso, resultariam
em alterações permanentes no trato reprodutivo no rato macho após o nascimento”.
As
mães grávidas foram expostas a uma série de diluições (100%, 50%, 25%, 12,5%,
6,25% ou controle veicular) de uma mistura contendo pesticidas, ftalatos e
drogas (p, p'-DDE, linuron, procloraz). , procimidona, pirifluquinazona,
vinclozolina, finasterida, flutamida, sinvastatina e 9 ftalatos [dipentila,
diciclohexila, di-2-etilhexila, dibutila, benzilbutila, diisobutila,
diisoheptila, dihexila e diheptil].
A
dose máxima continha 20% de cada substância
química de nível de efeito adverso mais baixo
observado para a alteração reprodutiva masculina mais sensível após à exposição in utero.
Foi descoberto que os filhotes de ratos machos apresentavam uma variedade de
efeitos neonatais, puberais e adultos permanentes em todos os níveis de dose.
Mesmo na mais baixa (cada substância química aproximadamente 80 vezes abaixo do
nível de efeito adverso mais baixo observado) houve reduções permanentes em
vários pesos de tecido do trato reprodutivo.
No
grupo de dose máxima, 100% dos descendentes do sexo masculino apresentaram
defeitos congênitos graves permanentes, incluindo malformações genitais. Apesar
de atuar por meio de cinco diferentes eventos de iniciação molecular, 18
substâncias químicas puderam se combinar para
produzir efeitos aditivos mesmo quando cada composto estava em uma dose relativamente baixa.
O efeito da
presença de produtos tóxicos na saúde dos bebês
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No parto, estudos comprovam que, nos
poucos segundos em que o bebê passa pelo ambiente vaginal, o contato com a
flora influenciará de forma benéfica o seu sistema imunológico. Após o
nascimento, sem dúvida alguma, o leite materno
será o alimento mais saudável para o bebê. “Porém, ele também é um meio de
excreção de toxinas e, por isso, infelizmente pode estar repleto de substâncias
químicas como agrotóxicos. Portanto, quanto mais precoce for iniciado um
processo de limpeza e desintoxicação na mãe, melhor será a qualidade do leite
materno, assim como do ambiente intrauterino”, afirma Cambiaghi.
Em 2010, um artigo publicado na
revista Pediatrics,
a mais importante e tradicional revista científica de pediatria do mundo,
estudou a relação de pesticidas e distúrbios de comportamento. Foi comprovada
uma ligação entre a exposição a pesticidas e a presença de sintomas de
transtorno de déficit de atenção com hiperatividade. Foram avaliados os níveis
de pesticidas da urina de 1.139 crianças, e os autores concluíram que a
exposição a pesticidas organofosforados, mesmo em níveis considerados
“normais”, pode contribuir para o aparecimento do TDAH.
“Fica aqui mais um alerta: nenhuma
doença genética tem caráter endêmico, ou seja, sua incidência não aumenta. Portanto, em
todas as doenças, desde as mais simples como alergias, estresse e hiperatividade até infertilidade, aquelas autoimunes, autismo e câncer, quando existe
um aumento da incidência delas, existe um ou
provavelmente vários fatores ambientais envolvidos”, enfatiza o especialista.
“A multicausabilidade dessas doenças
dificulta determinar os agentes. Mas existe uma clara relação entre as
expansões das fronteiras agrícolas com o aumento da incidência de determinadas
doenças em trabalhadores do campo, como leucemia em crianças que viveram em
plantações de soja”, finaliza Cambiaghi.
O que pode ser feito para reduzir a exposição a
produtos químicos e tóxicos
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. Não fume e evite tornar-se um
fumante passivo;
· Procure saber o que compõe a água que
você bebe;
· Se necessário, filtre a água,
ferva-a;
· Reduza o consumo de espécie de
peixes que contenham altos níveis de mercúrio,
dioxina e PCBS, como o atum, mas não pare de
comer essa carne. Se for utilizar pílulas de
óleo de peixe, use as de marcas conhecidas. O ômega 3 contido nesses
suplementos é importante antioxidante;
· Se possível, compre alimentos orgânicos.
Se não for possível, lave e descasque os itens antes de comê-los para remover os produtos
químicos agrícolas que eles possuem;
· Reduza ou evite o uso de pesticidas
em casa, no jardim e nos seus animais quando possível. Tente alternativas
não-tóxicas;
· Evite ambientes que foram
dedetizados com pesticidas ou herbicidas. Dependendo do produto e condições do local, a duração do efeito pode ser de um dia a até um ano;
· Seja cauteloso com alguns alimentos
coloridos. Em maquiagem, medicamentos ayurvedicos da Índia, algumas ervas
chinesas, alguns brinquedos ou adornos de chiclete preparados nos Estados
Unidos, pois, nesses produtos foram encontrados
altos teores de chumbo;
· Evite mamadeiras e outros produtos
de policarbonato que possam entrar em contato com a comida porque podem ter
entre os componentes da fabricação o bisfenol (composto químico presente em
garrafas de PVC);
· Procure saber se o material plástico contém phthalates (pergunte
ao fabricante). Nunca cozinhe no micro-ondas
alimentos em tigelas plásticas porque podem expelir componentes nocivos;
· Compre produtos pessoais (xampu,
maquiagens, loções etc.) sem phthalates e outros tóxicos;
· Use produtos de limpeza não-tóxicos
e biodegradáveis;
· Mantenha sua casa bem ventilada
quando for pintá-la, limpá-la ou quando estiver
fazendo qualquer trabalho usando cola, tinta, resinas etc;
· Evite o uso de florais e fragrâncias
que perfumem o ambiente;
· Se julgar necessário, consulte um
especialista em Medicina Ocupacional e Ambiental, caso esteja muito preocupado
com o ambiente de trabalho ou de casa e queira
uma avaliação da exposição pessoal;
· Procure não comer frutas e vegetais com
casca, pois podem estar contaminados com pesticidas.
Fonte: Arnaldo
Schizzi Cambiaghi é diretor do Centro de Reprodução Humana do IPGO, ginecologista-obstetra especialista em medicina reprodutiva.
Membro-titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, da Sociedade Brasileira de
Cirurgia Laparoscópica, da European Society of Human Reproductive Medicine.
Formado pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa casa de São Paulo e
pós-graduado pela AAGL, Illinois, EUA em Advance Laparoscopic Surgery. Também é
autor de diversos livros.