Vírus da
Gripe Espanhola se espalhou rapidamente
e atingiu diversas capitais brasileiras créditos: Dario Studios / Depositphotos |
Especialista conta
como Gripe Espanhola matou dezenas de milhões com desinformação e transmissão
acelerada
O componente de História nas escolas, além de
outros benefícios, tem como objetivo ensinar erros cometidos no passado para
que a sociedade saiba como evitar que se repitam. Olhando para as grandes
pandemias que já assolaram o mundo, uma que se assemelha bastante à atual crise
do novo coronavírus (Covid-19) foi a Gripe Espanhola. “Com os primeiros casos
aparecendo no primeiro semestre de 1918, a Gripe Espanhola surgiu quando o
mundo experimentava a Grande Guerra”, conta o coordenador da assessoria de
História, Filosofia e Sociologia do Sistema Positivo de Ensino, Norton Frehse
Nicolazzi Junior. “Ela acabou sendo chamada de espanhola, cogita-se, pelo fato
da Espanha ser um país neutro na Guerra. Nenhum país naquele momento ia se
responsabilizar por disseminar aquele vírus de mortandade tão grande”, explica.
Como o Brasil também participou da guerra, o
professor lembra que os primeiros brasileiros infectados foram membros de uma
frota brasileira contaminada na costa do mediterrâneo. “Segundo os registros,
aproximadamente 1.200 homens estavam nos seis navios da frota brasileira, mil
caíram doentes e 156 morreram alguns dias depois”, relata o professor. Mas a
chegada do vírus se deu em meados do mês de setembro de 1918, com a vinda, ao
Rio de Janeiro, de um navio britânico com aproximadamente 200 tripulantes
doentes e outros infectados aparentemente saudáveis. A partir desse momento,
esses marinheiros se misturaram com a população e acabaram transmitindo o
vírus, causando um contágio em progressão geométrica”, descreve Nicolazzi. A
situação ficou tão precária no país que o presidente da República no momento,
Rodrigues Alves, morreu em 1919, em decorrência da pandemia.
Aprendizados e lições
Material
didático aborda epidemias,pandemias
e endemias históricas créditos: Livro didático Sistema Positivo de Ensino |
O especialista conta que as medidas de fechamento
de fronteira e isolamento são lições aprendidas com a Gripe Espanhola e,
anteriormente, com a Peste Bubônica. “Esse isolamento se mostra necessário se
pensarmos na analogia histórica. No caso da Gripe Espanhola, a fronteira aberta
permitiu que o vírus chegasse e rapidamente se espalhasse por diversas capitais
brasileiras”, relata Nicolazzi. “No espaço de um mês, em capitais mais
afastadas do litoral, tínhamos cerca de 20 óbitos por dia. Se houvesse um
fechamento de fronteiras e isolamento, esse número certamente seria
menor”.
Outro aprendizado é o fato de que uma pandemia não
faz distinção entre credo, raça ou classe social. “O alcance do vírus ao
presidente, com o fato do Rio de Janeiro ser a capital federal naquela época,
nos levar a concluir que realmente não havia ninguém imune. A peste também
mostrou isso na Europa, dos mais pobres ao grandes lordes, todos estavam
sujeitos a serem infectados pelo vírus. Só o fato do presidente estar morando e
convivendo no Rio de Janeiro fez com que ele estivesse suscetível ao contágio,
como de fato aconteceu”, evidencia o professor.
Material
didático aborda epidemias, pandemias e endemias históricas
Globalização e
desinformação
“Ainda não temos condições de mensurar ou comparar
a atual epidemia com as anteriores, mas essa expansão, da maneira como ela
ocorre, é fruto do próprio processo de progresso técnico, de progresso
econômico e da ideia de uma globalização de trânsito”, diz Nicolazzi. “As
pessoas em trânsito favoreceram a disseminação da Peste no final do período
medieval e a disseminação da Gripe Espanhola no início do século XX, com navios
circulando o mundo inteiro em função da guerra. Isso tudo favoreceu muito a
propagação das doenças, assim como hoje o vírus facilmente acessa o mundo
todo”.
Quanto à desinformação notada nos dias atuais, o
professor conta que décadas atrás era muito pior. “As principais potências
envolvidas na guerra esconderam os casos de Gripe Espanhola para não transmitir
fraqueza durante o confronto. As pessoas achavam que não seriam contaminadas
até o momento em que elas começam a ver os seus próximos adoecerem e morrerem
em questões de poucos dias”, expõe.
“As pessoas, de certa forma, buscam um conforto
numa informação. Então, a não aceitação da gravidade do problema no primeiro
momento faz parte da própria dinâmica das pessoas de tentarem de alguma forma
se protegerem. Em 1918, eles acabavam acreditando em qualquer coisa. O povo
depositava suas esperanças em purgantes preparados à base de alfazema, de
limão, cebola, vinho do Porto, cachaça, enfim, qualquer coisa que pudesse lhes
dar um certo conforto. No Rio de Janeiro, tinha até distribuição de canja de
galinha como a salvação contra a Gripe Espanhola. E nada disso, obviamente,
surtiu efeito”, esclarece Nicolazzi.
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