Este
artigo é sobre como acabar com a pobreza ainda em nossa geração. Não é uma
previsão, eu até gostaria que fosse, mas está mais para uma profecia
autorrealizável.
Quando
assistimos aos noticiários no Brasil e vemos a quantidade de pessoas mortas
vítimas de violência, as filas dos hospitais, a violência doméstica, os
desastres ambientais, talvez devêssemos alterar as chamadas noticiosas para:
"Milhares de pessoas morrem no Brasil vítimas da miséria e da
desigualdade". Certamente é aí que tudo começa.
Lembremos,
o Brasil permanece com uma população de 16 milhões de pessoas abaixo da linha
de extrema pobreza. E, segundo estudo da Oxfam Brasil, apenas seis pessoas no
país possuem riqueza equivalente ao patrimônio dos 100 milhões de brasileiros
mais pobres.
E
os 5% mais ricos detêm a mesma fatia de riqueza que os demais 95% da população.
Como podemos difundir a prosperidade econômica em uma nação com dados como
esses? E é exatamente esta reflexão que pretendo estimular: como podemos
cocriar uma sociedade mais justa para todos.
"Os
direitos humanos não são violados apenas pelo terrorismo, pela repressão ou
pelo assassinato. As estruturas econômicas injustas que geram enormes
desigualdades, também os violam", disse o papa Francisco.
Alguns
perguntariam como é possível falar sobre a difusão da prosperidade econômica no
cenário atual de instabilidade econômica e financeira, com os dados de
desigualdade amplamente mapeados e disseminados e conhecidos por todos, e em
que a corrupção e a desigualdade se retroalimentam?
Bem,
assim como Jeffrey Sachs, eu diria, não se trata de ser otimista ou pessimista,
mas sim de ajudar a moldar o futuro.
No
livro o "Fim da Pobreza", Jeffrey nos mostra um exemplo inspirador.
Há 85 anos, durante a grande depressão, a Grã-Bretanha e outros países
industriais viviam um cenário de extrema pobreza.
Keynes
afirmou que os avanços tecnológicos e científicos, como pilares de um
crescimento econômico sustentável, tiraria os países –que hoje conhecemos como
os mais ricos do mundo– de uma situação de miséria.
Faço
aqui o contraponto, do quanto da saída dos países europeus e dos Estados Unidos
da miséria se deve as suas externalidades aos países ditos de terceiro mundo ou
em desenvolvimento.
Não
podemos negar que uma parte da prosperidade das grandes potências mundiais se
dá às custas de um processo que infringe os países de terceiro mundo todo o
lado negativo e problemático dos seus avanços.
No
entanto, vale aqui também mergulhar no que foi feito de forma correta e que
deveria ser um exemplo para aqueles que hoje estão afogados em um momento de
agonia e incertezas.
Sabemos
que a primeira coisa que nos vem à mente é o investimento em educação. No
entanto, como escutei recentemente de Ricardo Henriques, um dos maiores
especialistas em educação do país, "lançar toda a responsabilidade de
salvação do Brasil na educação, imprime nesta área uma pressão de resolução, da
qual ela não dá conta sozinha".
Por
isso, além das obviedades da necessidade de investimento em educação e combate
a corrupção, gostaria de elencar aqui outros aspectos que considero
fundamentais, observando a redução de desigualdades em comunidades no Brasil e
na América Latina ao longo dos últimos 14 anos trabalhando em empresas privadas
em processos intersetoriais para a melhoria da qualidade de vida das pessoas.
A
difusão da prosperidade econômica e a redução das desigualdades somente são
possíveis seguindo alguns passos.
Primeiramente,
assegurar uma perspectiva de entendimento que a desigualdade, principalmente no
Brasil, só será reduzida com uma perspectiva de valorização da diversidade.
Afinal, a desigualdade no país tem raça, cor, gênero e condições financeiras.
Todos
os estudos apontam a vulnerabilidade das mulheres, dos negros, da população
LGBT e das pessoas com deficiência. Não se resolve esta questão da desigualdade
no país excluindo grupos sociais relevantes.
Em
segundo lugar, os processos mais exitosos que observei se basearam na
mobilidade social, iniciativa individual e investimento na potência de
indivíduos transformadores.
Por
fim, o fortalecimento de instituições de liberdade política (liberdade de
expressão, debate aberto, mecanismos de controle) e da sociedade civil
organizada.
Em
meio à 4ª Revolução Industrial, se não quisermos perder o bonde de vez do
investimento em ciências e tecnologia, somente terá um lugar na nova era a
sociedade que estiver na vanguarda das mudanças exponenciais que estão
ocorrendo no mundo.
Todas
as vezes que participei de processos em pequenas comunidades, atentando a esses
pilares, observei empoderamento, crescimento e transformação social claramente
notáveis e comprovados por indicadores sociais.
Correndo
o risco de ser clichê, é notório que o Brasil tem vantagens geográficas e
riquezas ambientais que nos colocam em uma situação de privilégio frente a
outras nações. Porém, com algum esforço dos poucos que centralizam os caminhos
percorridos pelo país e muita alienação coletiva, corremos o risco de perder o
momento de transformações globais de uma vez por todas.
Portanto,
você que está lendo esse texto para coconstruir esse processo, seja em que
lugar da sociedade estiver, em que frente queira atuar, que tal chamar para si
agora a responsabilidade de fazer parte dessa mudança?
LILIANE ROCHA - CEO e fundadora
da Gestão Kairós, consultoria especializada em sustentabilidade e diversidade,
é autora do livro "Como ser um líder Inclusivo" e mestre em Políticas
Públicas pela FGV.
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