Tecnicamente igual à cirurgia de catarata, a chamada “troca do cristalino com finalidade refrativa” é feita quando o paciente ainda não desenvolveu a doença, e visa eliminar o uso dos óculos por meio do implante de lentes intraoculares
O cristalino é uma das lentes naturais
dos olhos que, juntamente com a córnea, forma o sistema de focalização das
imagens. O envelhecimento natural diminui a sua elasticidade e transparência,
de forma que a perda progressiva do primeiro fator dificulta a focalização à
curta distância, usada para ler e realizar tarefas manuais. Esta dificuldade é
chamada de presbiopia e tem seu aparecimento, influenciada por fatores
genéticos e ambientais, ao redor dos 45 anos, fase na qual poderá acontecer uma
perda progressiva da transparência e a formação da catarata. De tratamento
exclusivamente cirúrgico, ela exige a substituição do cristalino opacificado
por uma lente intraocular. O procedimento, contudo, pode ser realizado antes
mesmo do aparecimento da catarata, com o objetivo de tratar a presbiopia,
reduzindo ou eliminando a necessidade do uso de óculos. Estamos falando da
troca refrativa do cristalino, como prefere chamá-la o Dr. Marcello Fonseca.
Para aqueles que não desejam usar
óculos, as diversas modalidades de cirurgias refrativas são excelentes soluções
para deixar o acessório de lado. As mais conhecidas são aquelas que utilizam o
laser para corrigir a miopia, o astigmatismo e a hipermetropia. Contudo, quando
o assunto é a presbiopia, o laser não é suficiente para restaurar a visão em
todas as distâncias. Resta, então, a intervenção no cristalino com a sua
substituição por lentes intra-oculares.
Segundo o Dr. Marcello da Fonseca, apesar de utilizar a mesma técnica da cirurgia de catarata, o procedimento de troca refrativa do cristalino possui mais um objetivo. “A cirurgia de catarata moderna, com implante de lentes intraoculares, existe desde os anos 60, mas foi neste século que a técnica e a qualidade dos implantes a tornaram tão eficiente e precisa a ponto de mudar de categoria. O que antes se fazia apenas para restaurar a transparência perdida com o aparecimento da catarata assumiu um papel de correção precisa da refração, possibilitando uma visão focalizada em todas as distâncias”, explica o Diretor do Instituto da Visão de Curitiba (iVisão).
No início dos anos 90, a chegada das lentes dobráveis e, logo depois, das lentes multifocais, fez com que a indicação da cirurgia de catarata acontecesse de maneira cada vez mais precoce. “No início dos implantes de lentes multifocais, operávamos apenas os pacientes com catarata. Mas, quando um paciente de 70 anos ou mais operava a catarata e acabava por se livrar dos óculos, era acompanhado meses depois por um filho que, também, gostaria de se livrar dos óculos”, relata o médico.
Como toda inovação, essa expansão de possibilidades para uma cirurgia que até então tinha um único objetivo dividiu opiniões na área médica, com alguns oftalmologistas mais conservadores mantendo a indicação apenas nos casos de catarata. O Conselho Federal de Medicina (CFM), depois de longo debate, reconheceu a eficácia e a segurança da cirurgia em um parecer publicado em fevereiro deste ano, no qual orienta a sua inclusão na prática médica como procedimento seguro quando observadas as suas corretas indicações.
CIRURGIA ESTÉTICA
DA VISÃO?
Uma vez que a cirurgia tem por finalidade a correção de grau, assume um compromisso com o resultado, aproximando-a de alguns procedimentos estéticos. Para o Dr. Marcello, contudo, a semelhança para por aí.
“Quando realizamos a cirurgia de
catarata, buscamos tratar uma doença, visando corrigir uma deficiência visual
que prejudica a saúde ocular do paciente. Não raramente, depois da cirurgia, o
auxílio de óculos para uma visão perfeita em todas as distâncias é necessário.
Na troca refrativa do cristalino, a ideia é reduzir ao máximo essa necessidade
e, de preferência, eliminá-la.”, esclarece.
Para alcançar este objetivo, tudo tem
que estar perfeito. Saúde ocular em perfeito estado, com córnea e retina normais,
exames pré-operatórios realizados com muita atenção e uma detalhada explicação
sobre as vantagens e desvantagens do procedimento. Nenhuma prótese substitui
perfeitamente todas as características do órgão original e é fundamental manter
as expectativas realistas. Por conta disso, o procedimento possui um grupo
específico para o qual é destinado. São eles pacientes saudáveis acima dos 50
anos que tenham presbiopia (“vista cansada”), com a presença ou não de miopia,
hipermetropia e astigmatismo.
O procedimento é rápido e com anestesia tópica - colírios anestésicos. Normalmente se faz um olho de cada vez, com intervalo de 1 semana. A recuperação visual varia de acordo com cada caso, mas, em geral, alguns dias após o segundo olho operado a visão já está recuperada. Uma vez que as maiores alterações refracionais (do grau) acontecem no cristalino e a catarata não mais será um problema, o resultado obtido deve perdurar a vida toda. Isto, contudo, não elimina as chances de que outros problemas nos olhos venham a dificultar a visão e, portanto, o acompanhamento frequente faz-se necessário.
Como toda cirurgia, esta também possui
riscos. Sendo um procedimento intra-ocular, as consequências de uma infecção,
por exemplo, podem ser muito graves. Por outro lado, a realização dos
procedimentos em hospitais especializados, como o iVisão, bem como a evolução
das técnicas cirúrgicas, tornaram o risco de infecção um acontecimento raro. Um
recente estudo conduzido pelo Instituto Tadeu Cvintal de São Paulo e publicado na
Revista Brasileira de Oftalmologia, mostrou 35 casos de infecção em mais de 27
mil cirurgias. Nesta amostra a incidência média entre os anos foi de 0,13%.
“O reconhecimento da segurança deste
procedimento para pacientes presbitas e sem catarata era algo aguardado por
muitos oftalmologistas brasileiros, pois já é aceito em muitos países há muitos
anos. Nenhum procedimento médico tem o respaldo de 100% da comunidade
científica, mas acredito que vamos operar cada vez menos cataratas e cada vez
mais presbiopias. A ideia de que o homem vai se fundir com tecnologias
complementares já está acontecendo.”, finaliza o oftalmologista.
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