Somos passionais. Sem pestanejar percebemos nosso coração pulsar em umdebate entre Palmeiras e Corinthians, entre Salgueiro e Mangueira, bolacha e biscoito. Esses são assuntos sobre os quais podemos arbitrar livremente. Escolhemos aquilo que mais reverbera em nós e o defendemos, torcemos, vibramos. Faz parte de nosso cotidiano a disputa sadia entre diferentes pontos de vista.
Na contramão desse pensamento, ao falarmos sobre
assuntos menos triviais, nosso posicionamento deveria ser outro. Contudo,
experimentamos uma época onde qualquer pessoa se sente capacitada, ou mais do
que isso, impulsionada a opinar sobre os mais diversos temas - inclusive sobre
os quais não possui nenhum domínio ou estudo. A possibilidade de fala se
transfigurou em necessidade de emissão de opinião.
De certo, com as facilidades que as novas
tecnologias trazem consigo, temos muito mais acesso a informações do que em
qualquer época pregressa. Basta um clique eencontramos notícias referentes às
questões mais distintas de qualquer parte do mundo. E, se de algum modo isso
expande nosso campo de aprendizagem, por outro nos leva a falsa ilusão de que
somos peritos em áreas que fogem completamente a nossa compreensão.
Esse tipo de posicionamento pode ajudar a
sedimentar uma segregação irreversível. Quando polemizamos todo novo
acontecimento e discutimos rasamente as ideias que o circundam, de acordo
apenas com nossa própria interpretação, destituímos o poder da formação e da
educação para a consolidação dainformação. Paramos de observar o que
desconhecemos e nos colocamos em uma posição de onisciência prepotente.
Freqüentemente, é nesse lugar que se instalam os
maiores duelos. Quanto menos argumentos possuímos, mais cegamente nos atemos ao
pouco que sabemos, sem abrir espaço para abraçar os argumentos contrários. E
assim, cada vez mais nos aproximamos do ódio e nos fechamos para o desigual,
desacreditando o que não coincide com os nossos modos próprios de enxergar o
que desejamos.
O narcisismo é um sintoma crescente de nossos
tempos. Entender-se como modelo é inevitavelmente criar um conceito prévio do
que é certo ou errado, possível ou inaceitável. E quando expandimos esse modo
de agir para os setores que nos são desconhecidos, reduzimos a orientação de
mestres e doutores ao nível do que supomos fazer sentido. Desacreditamos a
ciência. Desabonamos saberes.
Quando confiamos em possuir uma sabedoria
específica sobre todas as áreas que atravessam nossa história, nos fechamos
para a possibilidade de aprender. Permanecemos hermeticamente encerrados em
nossas crenças em detrimento de qualquer relação com aquilo que difere de nós.
Desse modo, paulatinamente, dispensamos o conhecimento porque estamos
irreversivelmente presos à ilusão dele.
Bruna Richter -graduada em Psicologia pelo IBMR e
em Ciências Biológicas pela UFRJ, pós graduanda no curso de Psicologia Positiva
e em Psicologia Clínica, ambas pela PUC. Escreveu os livros
infantis: “A noite de Nina – Sobre a Solidão”, “A Música de Dentro – Sobre a
Tristeza” e ” A Dúvida de Luca – Sobre o Medo”. A trilogia versa sobre
sentimentos difíceis de serem expressos pelas crianças – no intuito de
facilitar o diálogo entre pais e filhos sobre afetos que não conseguem ser
nomeados. Inventou também um folheto educativo para crianças relacionado à
pandemia, chamado “De Carona no Corona”. Bruna é ainda uma das fundadoras
do Grupo Grão, projeto que surgiu com a mobilização voluntária em torno de
pessoas socialmente vulneráveis, através de eventos lúdicos, buscando a livre
expressão de sentimentos por meio da arte. Também formada em Artes Cênicas,
pelo SATED, o que a ajuda a desenvolver esse trabalho de forma mais eficiente.
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