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terça-feira, 15 de setembro de 2020

O Índice Geral de Preços (IGP) como vilão dos lojistas no Brasil

Temos ouvido nos últimos dias notícias sobre a disparada da inflação, com destaque para os preços dos alimentos e da gasolina. Cumpre esclarecer que o fenômeno chamado “inflação” é medido segundo critérios próprios e apresenta variações dependendo do índice adotado. No Brasil a inflação oficial é determinada pelo IBGE, por meio do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo). Para se ter uma ideia, este indexador bateu 0,24% em agosto de 2020, percentual que representa a maior alta no mês desde 2016. Em julho o aumento foi ainda maior de 0,36%. No ano a variação é positiva em 0,70% e em 12 meses 2,44%.

Por outro lado, existem os índices denominados “Índice Geral de Preços Mercado” (IGP-M) e “Índice Geral de Preços Disponibilidade Interna”, ambos conferidos pela Fundação de Getúlio Vargas, os quais apontaram para uma inflação muito superior. A diferença entre o IGP-DI e o IGP-M é o período de coleta das informações. Estes indexadores são usados em diversos tipos de contratos, inclusive os de locação de imóveis comerciais. Diferentemente do IPCA/IBGE, por exemplo, os IGPs têm em sua composição, correspondendo com 60%, o IPA (Índice de Preços ao Produtor Amplo – antes conhecido como Índice de Preços por Atacado). Por esta razão, estes índices sofrem grande influência de variações no câmbio, preços de commodities etc.

O IGP-M elevou 2,74% em agosto, acumulando 9,64% no ano 2020 apurado até o mês de agosto e 13,02% em 12 meses também nesta base. Em agosto de 2019, o indexador apontou deflação (queda) de 0,67% e acumula alta de 4,95% nos últimos m 12 meses. O IGP-DI agora em agosto foi ainda mais oneroso com a incrível variação positiva de 3,87%.

Comparando o IPCA/IBGE e o IGP-M/FGV a contar de 2018, observamos um descolamento deste último, o qual acelerou em 2020:

2018

2019

2020

IPCA/IBE

3,75%

4,31%

0,70%

IGP-M/FGV

7,54%

7,30%

9,64%

Considerando que grande parte dos contratos de locação de imóveis destinados para fins comerciais o índice de reajuste do aluguel eleito é o IGP-M ou IGP-DI, não precisa dizer o problema enorme que os lojistas estão passando, uma vez que os seus locativos sofreram ou sofrerão majorações expressivas, lembrando que o setor varejista foi severamente afetado pela pandemia de Covid-19.

A correção monetária do aluguel não é obrigatória, isto é, depende de cláusula estabelecida no contrato e locação. Além do mais, não existe um índice exclusivo para os aluguéis, ou seja, as partes são livres para elegê-lo. Ocorre que na prática muitos locadores impõem os IGPs, em que pese os pleitos dos lojistas. Uma solução intermediária seria definir como critério de reajuste a aplicação do percentual médio entre o IGP e o IPC.

Conforme estudos realizados, inclusive pela Fundação Getúlio Vargas, os IPCs são os indexadores mais indicados para reajustar os aluguéis oriundos de contratos de locação de imóveis destinados para lojas, na medida em que as suas variações acompanham os preços dos produtos destinados ao consumidor final, ao contrário do que acontece com os IGPs e outros.

Sob esta ótica, defendo que os lojistas inquilinos de imóveis comerciais têm fortes argumentos para requerer judicialmente a substituição dos índices de reajustes, quando estes se apresentam inadequados e excessivamente onerosos, seja através de ação própria ou por meio das ações revisional de aluguel e renovatória de contrato de locação. Como a pandemia do novo Coronavírus refletiu na inflação apurada pelos IGP, bem como caracteriza fato imprevisível e extraordinário, os prejudicados possuem ainda mais argumentos para justificar a alteração do indexador.

As majorações trazidas pelos IGPs são impossíveis de serem absorvidas pelos comerciantes e acarretam em distorções que só beneficiam os locadores, além de serem ruins para toda a sociedade, tendo em vista que, no final das contas, impactam os preços dos produtos finais.  




Daniel Cerveira - advogado, sócio do escritório Cerveira, Bloch, Goettems, Hansen & Longo Associados Advogados Associados, consultor jurídico do Sindilojas-SP, pós-graduado em Direito Econômico pela Fundação Getúlio Vargas São Paulo, autor do livro "Shopping Centers - Limites na liberdade de contratar", Editora Saraiva e professor dos cursos MBA em Varejo e Gestão de Franquias da FIA – Fundação de Instituto de Administração e da pós-graduação em Direito Imobiliário do Instituto de Direito da PUC/RJ 

 

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