Um tema que cabe
repetir, e que repito, por tão essencial. Todas as pesquisas ao redor do
planeta chegam à mesma conclusão: sexo, fantasiar sobre a prática de sexo, está
entre os pensamentos que mais passam pela cabeça de qualquer um de nós; no
correr da existência, é o que mais nos habita a imaginação, é o devaneio que
mais nos dá prazer.
O mundo inteiro
deseja sexo, incluindo eu e quem me lê. Contudo, sexo é o que há de mais
censurado. Parece que nada se vigia tanto, nada se controla tanto quanto o
órgão sexual feminino. Mas, também as “partes” masculinas sofrem censura. Há
uma geografia do corpo: todo ele pode ser exposto; “aquele” pedacinho, contudo,
não. Sexo, não. Sexo não pode.
Investigações de
laboratório confirmam o que sabemos na prática: a satisfação que o sexo
proporciona. Nada é mais estressante do que a carência sexual; nada é mais
prazeroso, física e psiquicamente do que a relação sexual. Não obstante, muita
gente – mais gente do que se imagina – complica-se, seja para falar do assunto,
seja para realizar o assunto.
Desconfio que esta
seja a raiz, sabida mas não assumida, da maioria dos males emocionais da nossa
época: comer em excesso, negação da vida pela depressão, noites na internet,
abuso de drogas. Há um fundo de insatisfação sexual em tudo isso. Duvido muito
que alguém fique cavoucando a web ou vá atacar a geladeira em estado de afeição
e prazer sexual.
Penso que o conflito
instalado na maioria das pessoas é entre o querer e o (suposto) não dever. O
mundo, sobretudo após a ascensão de Constantino à condição de imperador romano
(288 a 337), foi interditos e repressão. Em seu governo, a fé cristã se tornou
a religião oficial do Império; com ela veio a restrição aos prazeres da carne e
o elogio à abnegação e aos sacrifícios.
Por toda a Idade
Média e mesmo durante o Renascimento as práticas sociais dominantes foram de
sexualidade contida, ocultada, culpada. Não era incomum as pessoas açoitarem-se
pelas ruas. Isso só foi controvertido, na Europa em 1789 (Revolução Francesa),
no Brasil, em 1889 (República – a Constituição de 1824 declarava o catolicismo
como religião do Estado).
A repulsa social
mais ostensiva a este estado de coisas aconteceu apenas na segunda metade do
século passado. Sobretudo a partir da década de 1960, a juventude – as mulheres
principalmente – começou a romper uma ortopedia moral de séculos. O sexo deixou
de ser “pecado”. Os desejos vieram à tona, venceram os freios conservadores e
se estabeleceram.
Estes ímpetos de
buscar o gozo da felicidade, contudo, se chegaram como solução para muitos,
para a maior parte das pessoas vieram como problema. O fato de eu poder ver e
sentir a liberdade de comportamento nos livros, no cinema, na televisão, no meu
vizinho, no meu colega de escola, não quer dizer que eu a receba em mim com
conforto, ou que eu a realize.
A liberdade está na
minha frente, contudo, está no outro, não em mim. Já se pode, mas eu não posso.
Uma parte pequena do mundo goza, a grande parte gostaria, mas não ousa gozar
como se goza por aí. Por alguma razão sexo não se assentou nos hábitos gerais.
Ou assentou-se, não, todavia, como liberdade apaziguadora, mas como conflito:
menos prazer, mais ansiedade.
As pessoas procuram
jeitos. Saem-se com podem. A internet parece ser evidência disso. Na solidão da
noite, milhares de pessoas que não conseguem dizer pessoalmente de si e ouvir
sobre o outro, seduzir e dar-se por sedução, vão para seus computadores.
Algumas namoram nas telas, mas a maior parte mente para si mesma ou para
alguém, ou namora com pornografia.
Encontro matéria já
de uma década: “O Brasil é campeão mundial em acesso a conteúdo pornográfico na
internet, com 55% dos internautas. A média mundial é de 41% – sendo que 58% são
homens e 18%, mulheres” (Folhateen, 08jun09). Matéria relacionada informa que
“63% dos jovens não discutem abertamente sexo em casa. Homens entre 18 e 24
anos consomem mais pornografia on-line: 61% dos internautas brasileiros” (FSP,
02jun10).
De lá para cá, uma
reportagem (G1, 11ago15) que narra pesquisa cujos resultados não são pacíficos:
“Mulheres brasileiras são as que mais veem pornografia – Levantamento põe
Filipinas ao lado do Brasil (países no topo da catalogação de mais católicos do
mundo) em 1º lugar”. Ainda segundo o registro, “nos dois países 35% do consumo
de pornografia é realizado por mulheres [a média mundial é 24%] e 65% pelos
homens”.
Algo impede que
certas vontades (envergonhadas) sejam realizadas na realidade, com outra
pessoa, com declaração de gosto e consumação de ato. É impossível contar-se de
todo, mas nos contamos menos do que é possível nos contar. Insegurança,
angústia, culpa ou segredo (coisa a esconder) alimentam essa escolha. Se
milhares de brasileiros, de jovens, inclusive, têm opção preferencial de gozo
por computador, algo está errado.
Adultos deveriam
pensar sobre isso por interesse próprio, pois sempre é tempo de reencaminhar as
coisas. Pais deveriam refletir sobre isso no interesse dos filhos, pois sempre
é tempo de encaminhar as coisas. Adultos ou jovens, inseguros, arredios e
depressivos normalmente são vítimas de repressão. Às vezes, repressão que
exercemos sobre nós mesmos. Que recomendaria eu a quem padece desse mal, além
de psicanálise?
Aos jovens:
divirtam-se; sexo é mesmo legal. Aos adultos: repensem seus valores, suas
bitolas ideológicas; algo aí não lhes está fazendo bem. Para com seus filhos:
abram espaço ao diálogo, mas não se intrometam, não controlem. De algum modo
haverá sexo. É um imperativo da vida. Nos meios libertários haverá mais sexo
saudável; nos ambientes repressores, entre nada e alguma coisa, haverá
onanistas na frente do computador.
Léo Rosa de Andrade
Doutor em Direito pela UFSC.
Psicólogo e Jornalista.
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