A alimentação é considerada, no artigo 3º da Lei
Orgânica da Saúde (Lei 8080/90), elemento determinante e condicionante da
saúde. Também é assumida como direito humano, fundamental e social previsto nos
artigos 6º e 227º da Constituição Federal, definido pela Lei Orgânica de
Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN), bem como no artigo 11 do Pacto
Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e outros instrumentos
jurídicos internacionais. Decorre daí que o Estado brasileiro assume concepção
da alimentação em termos de Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA), que
deve ser efetivado levando em conta as noções de Segurança e Soberania
Alimentar.
A Segurança Alimentar e Nutricional consiste na
garantia de condições de acesso aos alimentos seguros e de qualidade, em
quantidade suficiente, de modo permanente e sem comprometer o acesso a outras
necessidades essenciais. Tal compreensão deve ser considerada em articulação
com a noção de Soberania Alimentar, o que implica dizer que cada país tem o
direito de definir suas próprias políticas e estratégias sustentáveis de
produção, distribuição e consumo de alimentos que garantam o direito à
alimentação para toda população, respeitando as múltiplas características
culturais dos povos.
Desses conceitos desdobra também importante
consideração acerca da complexidade do que seja alimentação adequada. A
adequação não deve ser tomada somente do ponto de vista biológico/nutricional,
dada a complexidade que marca as escolhas e práticas alimentares. A atenção à
alimentação deve ser adequada também (e sobretudo) do ponto de vista da
possibilidade de manutenção da diversidade cultural alimentar. Comida é também
identidade e cultura, de modo que a possibilidade de cultivar hábitos e
práticas alimentares culturalmente constituídas são qualidades do universo
microssocial que conformam dimensões macroeconômicas e políticas, e vice-versa.
De acordo como o entendimento da Organização das
Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), leis específicas podem:
determinar de forma clara o âmbito e conteúdo do direito à alimentação; definir
as obrigações do Estado relativamente a este direito; criar os mecanismos
institucionais necessários; fornecer as bases jurídicas para orientar e
implementar as políticas e qualquer regulamentação ou medidas que devam ser
adotadas pelas autoridades competentes; reforçar o papel a ser desempenhado
pelo poder judiciário na aplicação do direito à alimentação; capacitar os
titulares do direito para exigir que o governo cumpra as suas obrigações;
fornecer as bases jurídicas para a adoção de medidas com vista a corrigir as
desigualdades sociais existentes no acesso à alimentação; criar os mecanismos
financeiros para a implementação da lei.
Desse modo, é fundamental que a administração
pública (governo), a partir de seus marcos legais específicos, faça cumprir as
obrigações do Estado, construindo estratégias para assegurar acesso à
alimentação adequada, com base no conhecimento prévio do universo cultural
alimentar dos grupos a quem se destinam e com foco na produção local de
alimentos.
Silvana Maria dos Santos
- nutricionista, especialista em Saúde Coletiva, mestre em Antropologia Social
e professora de Saúde Coletiva da Universidade Positivo (UP).
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