É verdade que a hegemonia esquerdista
desgraçou-se naquela esquina do tempo em que a crise causada pela
irresponsabilidade fiscal se encontrou com as revelações sobre a corrupção. Mas
o projeto para a conquista da hegemonia era primoroso. Fazia parte dele o
fatiamento da sociedade com a escolha de determinados grupos sociais contra os
quais se lançaram contra todas as injúrias de modo a suscitar animosidade. Era
a velha luta de classes adquirindo múltiplas formas num engenhoso caleidoscópio
político.
Estão
no foco dos antagonismos e execrações cultivadas ao longo das últimas três
décadas:
·
os conflitos "raciais" e a imediata identificação da população
branca como devedora de uma conta acumulada em três séculos e vencida desde
1888;
·
os conflitos de "gênero", em que as presunções de
responsabilidade recaem sobre os heterossexuais do sexo masculino que, ademais,
são presumivelmente machistas;
·
os conflitos de classe social, onde os ressentimentos se concentram nos
andares mais altos da classe média para cima, lá onde se situam os maiores
ódios de Marilena Chauí;
·
os conflitos retrô do mundo do trabalho, institucionalmente
patrocinados, nos quais o setor público, supostamente abnegado e generoso, vê
com maus olhos o setor produtivo da economia e o "diabólico" mercado.
·
os conflitos geracionais, face aos quais, quem tiver mais de 40 anos, é
um opressor, inconformado com a liberdade, autonomia, ideias e estilos de vida
das gerações mais jovens, devendo ser rejeitado por todos que aí se enquadrem,
inclusive pelos próprios filhos.
De
início foi um estratagema petista. Com o tempo, consolidaram-se os conceitos e
todos os demais partidos de esquerda passaram a adotá-lo. A imensa maioria dos
demais participantes dos mecanismos de formação da opinião pública a ele
aderiram: grandes meios de comunicação, mundo acadêmico, agentes do ambiente
cultural, militantes em ambientes virtuais e, até mesmo, grupos religiosos. No
andar da carroça foram nascendo centenas de movimentos, ditos sociais, cuja
existência tem tudo a ver, e só tem a ver, com a organização desses
antagonismos, cujo plantio ocorreu diante de nossos olhos.
Ao unir e estruturar uma infinidade de minorias para criar e gerir conflitos, a esquerda brasileira, pilotada pelo PT, definiu esse empreendimento como essência do famigerado "politicamente correto". Enquanto o cultivava, como estratégia diversionista, chegava ao poder e implementava aquilo que, desde logo, deveria ter sido compreendido como o conflito real, a ser enfrentado com total dedicação: a opressão do Estado contra todos, inclusive aqueles que a esquerda arregimentou para suas causas. De fato, o Estado brasileiro, de modo crescente, pratica contra a nação, sua vítima, os crimes de sequestro e extorsão. A cidadania nos põe, de modo irrecorrível, a mercê de um triplo garrote fiscal - federal, estadual e municipal - que não nos deixa alternativa.
Acabei de descrever o grande golpe através do qual o Estado, hegemonizado pela esquerda que se concentra nos seus quadros, subjugou e imobilizou a soberania popular. Um verdadeiro ippon no judô da política.
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.
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