Estou escrevendo este artigo de Atlanta, na
Geórgia, EUA, onde acontece a edição anual de um dos mais importantes
congressos acadêmicos de administração e negócios do mundo, a Academy of
Management. São mais de 10 mil participantes que compartilham seus estudos nas
diversas áreas de negócios e administração por 4 dias intensos de trabalhos e
reuniões. Em meio a todas as apresentações e leituras de artigos, parei para
refletir sobre a importância do conhecimento científico no avanço das técnicas
e práticas que líderes e empreendedores se apropriam para melhorar a gestão de
seus negócios e cheguei à triste conclusão de que talvez estejamos fazendo mais
mal ao mundo do que bem com nossos estudos.
Veja, por exemplo, um estudo publicado no portal
UOL recentemente: Maioria
das mulheres entre 18 e 24 anos se considera feminista. O estudo foi feito
pela agência de mídia UM London e se baseou em mais de 2.000 entrevistas no
Reino Unido. Você lê a matéria e, por diversos motivos, mas principalmente, por
ser um estudo feito por um instituto de pesquisa, você acredita nestes
resultados e assume como verdade. Bem, nós acadêmicos temos uma série de
questionamentos sobre esta tal ‘verdade’, e para ter certeza de que a pesquisa
é realmente um retrato da realidade, precisamos perguntar: Mas quem exatamente
foi entrevistado? Onde estas entrevistas foram feitas? Que perguntas foram
feitas? Qual foi o objetivo do estudo? Dependendo das respostas destas e de
outras perguntas, podemos desqualificar totalmente estes resultados.
Isso acontece o tempo todo, seja baseado em uma
pesquisa acadêmica ou um estudo não acadêmico, assumimos como verdade muito do
que ouvimos. Estas verdades se tornam nossos paradigmas, nossas convicções,
nossas crenças, mas não me entendam mal, paradigmas são bons porque retratam
padrões na realidade em que a sociedade se baseia para definir suas regras de
convivência. Assim, existem os paradigmas de que precisamos andar vestidos na
rua, que não devemos matar, que precisamos trabalhar para ter dinheiro para
sobreviver, que existe uma unidade da sociedade chamada de família e assim por
diante, sem os paradigmas nossa vida seria um caos.
Quando falo que muitas destas verdades que se
tornam nossos paradigmas podem estar fazendo mais mal do que bem, me refiro a
um lado ruim do paradigma que é a chamada ‘paralisia de paradigma’, quando
acreditamos que uma verdade é a única e incontestável verdade que existe. Por
muitos anos, acreditamos, devido a estudos científicos, que o sistema solar era
composto por 9 planetas, mas são 8. Acreditamos que a matéria assume 3 estados,
sólido, líquido e gasoso, mas isso não é verdade, existem estados
intermediários além destes. Acreditamos que as cores primárias são o vermelho,
o amarelo e o azul, mas na verdade são o ciano, o magenta e o amarelo.
As verdades absolutas definiram muito do que somos,
mas se estivéssemos presos a elas, nossa sociedade nunca avançaria. Ninguém
mais inventaria nada em 1899 porque Charles Duell, chefe da Secretaria de novas
patentes dos EUA disse que seu departamento poderia ser fechado porque não
existia mais nada para ser inventado. O cinema não seria o que é hoje porque
seus inventores, os irmãos Lumiere, achavam que seu invento não tinha nenhum
valor comercial. Da mesma forma, a TV não teria o poder que tem hoje porque a
Revista Times publicou um artigo dizendo que o invento era interessante, mas a
família americana média não teria tempo para ficar horas na frente do aparelho.
Vamos fazer um exercício mais prático para você
entender o meu ponto de vista. Pense em uma verdade incontestável, algo que
você acredita cegamente, como: ‘Chia faz bem para a saúde’, ‘pessoas ricas são
mais felizes’, ‘Se eu tomar banho de noite, durmo melhor’, qualquer coisa. Sua
verdade incontestável não precisa vir de um estudo ou de algo que você leu ou
ouviu, pode ser baseado apenas em suas próprias crenças e experiências
pessoais, mas já é suficiente para gerar um estrago na sua vida. Como saber se
é uma paralisia de paradigma que pode estar atrapalhando você? Existem vários
testes, mas o mais fácil e clássico é descobrir se outras pessoas pensam
diferente de você. Se você acha que fica bem de barba e todos à sua volta,
amigos, família, falam que não, talvez seja uma paralisia de paradigma sua. Se
você acha que puxar o saco do chefe aumenta suas chances de promoção, mas todos
os seus colegas aconselham você a não ir por este caminho, pode ser uma
paralisia de paradigma te levando a tomar decisões erradas. Em outras palavras,
a paralisia de paradigma é a sua teimosia em não aceitar o que todo mundo diz,
não ser flexível o suficiente para assumir que você pode estar errado no seu
jeito de pensar e no seu jeito de fazer as coisas.
Assim como estudos científicos podem estar errados,
suas crenças pessoais podem estar equivocadas também. Ou podem ter feito
sentido no passado, mas agora a realidade é outra e você precisa mudar o seu
jeito de pensar. Paralisias de paradigmas nos impedem de fazer mudanças
significativas, nos prendem ao passado, limitam nossa capacidade de inovar e
travam o nosso crescimento pessoal. Quando aprendemos a identificar nossas
paralisias de paradigmas aprendemos que nossas mais absolutas verdades e
crenças podem ser questionadas e que não existem verdades incontestáveis. A
única verdade incontestável que existe é que não existe verdade incontestável.
Marcos
Hashimoto - Co-fundador da Polifonia
e Professor de Empreendedorismo da Universidade de Indianapolis
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