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segunda-feira, 3 de julho de 2017

Caso Aécio Neves: Justiça popular versus preservação da legalidade



O caso do senador Aécio Neves (PSDB-MG) nos faz refletir sobre os caminhos jurídicos dos escândalos políticos no Brasil. No último dia 17 de maio, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin suspendeu Aécio Neves do exercício das funções parlamentares de senador da República, bem como impôs medidas cautelares consistentes como a proibição de contatar com outros investigados e de se ausentar do País, com entrega do seu passaporte.

Entretanto, dias depois o seu colega de Corte Superior, ministro Marco Aurélio Mello tomou uma decisão diferente, mostrou absoluta independência e coragem ao decidir por restabelecer à situação “jurídico-parlamentar” de Aécio Neves, afastando as medidas restritivas impostas pelo ministro Edson Fachin.

Consoante, consignou o Ministro Marco Aurelio “O Constituinte de 1988 optou por desenho capaz de assegurar o pleno exercício das prerrogativas atribuídas pelo voto popular aos parlamentares, base da democracia representativa. O sistema é amplo e direciona a garantir o exercício do mandato, em face de cassações e abusos ocorridos no passado recente, em regime de exceção, contra Deputados e Senadores. Buscou-se a prevalência da tomada de decisão por agentes políticos diretamente escolhidos pelo povo”.

Corroborando com a assertiva do ministro Marco Aurélio, a Constituição Federal, em seu artigo 53, §2º, estabelece que “Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão. ”

Conforme bem salientado pelo ministro Marco Aurélio “A imunidade não inviabiliza a persecução criminal, tampouco impede a prisão, mas, sim, estabelece limites rígidos a serem observados visando a plena atividade parlamentar.”

Ou seja, para que um parlamentar federal possa ser preso cautelarmente há que estar presente alguns elementos fundamentais:

a)       prisão em flagrante;

b)      por suposto cometimento de crime inafiançável e;


c)       autorização da Casa Legislativa a qual pertence o parlamentar.

Na hipótese em tela, caso Aécio Neves, nenhum dos requisitos foram preenchidos. Primeiro, não houve flagrante. E além disso, os crimes apontados ao senador (corrupção e lavagem de dinheiro) não são crimes inafiançáveis. Vale ressaltar também que não houve sequer consulta ao Senado Federal, razão pela qual não há reparos a serem feitos à decisão do Ministro Marco Aurélio.

Com efeito, o escopo da norma estabelecida no parágrafo segundo do artigo 53 é preservar o exercício do mandato parlamentar, cercando-o de segurança jurídica.

Assevere-se, ademais, que a preservação da atuação parlamentar resta inequívoca quando observamos o disposto no § 8º do artigo 53 da Constituição Federal. Citado preceito legal dispõe que as imunidades de deputados ou senadores persistem mesmo no estado de sítio, somente podendo ser afastadas por deliberação de dois terços dos membros da Casa respectiva, isso quando praticados atos incompatíveis com a medida extrema fora do recinto do Congresso Nacional.

Por óbvio, haverá quem diga que as gravações realizadas pelos representantes da JBS são indícios veementes contra o senador Aécio Neves, que poderiam ensejar as medidas aplicadas pelo Ministro Fachin.

Porém, não se pode olvidar que no Estado Democrático de Direito o primado da lei é inafastável.

Dessa forma, o ministro Marco Aurélio Mello apenas aplicou o regramento constitucional ao determinar o restabelecimento do cargo e a supressão das medidas acauteladoras. A decisão anterior do Ministro Fachin extrapolava os limites da razoabilidade, na medida em que além de retirar do cargo um Senador da República pautado em meras conjecturas, sem a existência sequer de processo-crime contra o parlamentar, impôs sanções cautelares ultrajantes, como a vedação de o Senador manter contato com a Irmã, também investigada.

Há que se destacar o brilhante trecho da decisão do Ministro Marco Aurélio em que acentua: “Nunca é tarde para observar-se a envergadura das instituições pátrias, a eficácia da ordem jurídica, alfim a independência e a harmonia entre os poderes. Paga-se um preço por viver-se em um Estado de Direito. É módico e está, por isso mesmo, ao alcance de todos: o respeito irrestrito às regras estabelecidas. ”

Os brasileiros de bem tem que lutar pela preservação, absoluta, da legalidade, pois um dia podemos estar envoltos em arbitrariedades que são perpetradas em nome de uma suposta “justiça”.





Marcelo Gurjão Silveira Aith - advogado especialista em Direito Público e Eleitoral e sócio do escritório Aith Advocacia




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